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26/04/2018

A crença na poesia e na dinamite

A crença na poesia e na dinamite
Resenha do livro "Troco Poesia Por Dinamite"
Sr. Arcano

O título do livro já nos traz uma reflexão: para muitos poetas, atualmente fazer poesia  é tão revoltante, que poderíamos supor que o escritor prefere trocar tudo por dinamite, com o intuito de explodir as injustiças que o rodeiam.

Em certas passagens o livro lembra o quanto essa profissão de poeta é ingrata. Tão ingrata que as pessoas não a reconhecem  como profissão. Pior: a tratam como um  material de vagabundagem, ou coisa para  quem não tem o que fazer.

Mas sem a poesia perdemos um instrumento que nos faz pensar, que nos traz momentos que mexem com nossos sentimentos. É literatura. E se desvalorizamos a poesia, isso quer dizer que estamos sendo intolerantes com a nossa própria capacidade de pensar e sentir.

Barata Cichetto, em seu livro “Troco poesia por dinamite”, lembra o quanto as pessoas são intolerantes com a poesia. Sendo que sua poesia já é, por si só, uma valorização dessa arte escrita.

O poema que abre o livro, “Troco poesia por sexo”, já nos deixa uma introdução do que é parte da poesia de Cichetto. Quando ele diz “Não se assuste  e não zombe de mim quando conto a epopeia / de um poeta que não trocou por nada sua vida e sua ideia. / Mas o fato que relato ao leitor, por mais que se ache sem nexo, /  foi que troquei minha poesia por um instante rápido de sexo. /  E se acham que fiz mal negócio dando poesia por um prazer, /  afirmo que nada mais sobre a arte e a poesia posso lhe dizer.”. A afirmação destes versos vem do fato de que é a experiência do autor que está em questão, como exemplo para o leitor, mostrando que se não fosse essa experiência, o autor não teria se tornado poeta. A vivência do autor é que tornou possível essa poesia.

A poesia é o todo; é o que tornou possível essa experiência, e vice-versa. A vida é essa poesia. Este é um exemplo de que existe poesia em tudo o que vivemos. Essa arte com versos e rimas é o fruto daquilo que vivemos. Papel, letras e versos bem construídos não significam muito se não tiverem a essência de uma experiência vivida pelo poeta.

O livro é dividido em cinco partes:
1 - Troco poesia por dinamite;
2 - Troco poesia por dinheiro;
3 - Troco poesia por Rock’n Roll;
4 - Troco poesia por sexo;
5 - Troco psicanálise por poesia.

Cada parte com um conjunto de poemas abrangendo um conteúdo diferente, de acordo com o que sugere cada título. Sendo que a poesia de Cichetto é inconfundível. Percebe-se que sua marca está em todo o livro, como quem diz: “O conteúdo é diferente, mas ainda sou eu!”. E é como se ele dissesse de forma bem contundente: “Ainda sou eu, porra!”. Pois o linguajar, por vezes, é vulgar, como num verso de seu poema ATO DE FÉ: “Seu nome era Maria e ela chupava cheia de graça”.

Mas não se enganem, achando que se trata de um poeta vulgar. Barata Cichetto é o que ele mesmo se define em seu poema FEDIDAS E FODIDAS: “Da sujeira sou o bardo e carrego imundície na mente / Sou poeta sujo e da sujeira é que carrego a semente. / Minha poesia é imunda, fede a bosta e quero a sujeira / Feito ao porco chafurdando na merda à sua maneira.”.

O poeta maldito de nossa época transfigura-se como o bardo da sujeira, pois vivemos em tempos sujos. Pego como exemplo a cidade do Rio de Janeiro (apesar de Barata ser de São Paulo, o que não difere muito), em que o centro da cidade é uma imundície total. A cidade maravilhosa de Tom Jobim e Vinícius de Moraes, hoje é rodeada por sujeira e poluição. Ao contrário do que falavam os poetas de antigamente sobre o Rio de Janeiro, a cidade em que se dizia da mulher: “olha que coisa mais linda, mais cheia de graça”, fala-se hoje apenas da sujeira, da prostituta, de imundícies. Este seria o retrato não só do poeta carioca atual, mas também de outros estados brasileiros.

E o autor mostra que, a seu exemplo, o poeta só pode mesmo é afundar-se na desgraça caso resolva assumir que é poeta. Nos versos do poema TROCO POESIA POR DINHEIRO, ele diz: “Queria mesmo era foder e ter dinheiro, foda-se a hipocrisia / Ter dentes inteiros, roupas decentes, mas tenho só a Poesia / E que grande bosta nascer poeta, eu preferia ser natimorto / Ou ter a sorte de ser apenas outro ato hediondo de aborto. / Quem sabe o que faria minha mãe se ao olhar àquele ser / Soubesse que em lugar de médico seria poeta ao crescer / Decerto num ato de vingança contra a natureza maldosa / Me jogaria na latrina e iria dormir com a mente insidiosa.”.

Estes versos traduzem bem o sentimento do poeta atual, numa sociedade que não valoriza a poesia em nada. Uma pessoa culta não significa nada atualmente, ao contrário da pessoa que é fútil; dos bandidos; e das putas (estas ganham mais dinheiro que qualquer poeta).

E não vamos esquecer da fama. Não importa como uma pessoa tornou-se famosa, mas se possui fama é valorizada. E pobre do ser que nasceu poeta. É o mesmo que nascer amaldiçoado.

O poeta nasceu com um princípio de dom, e conforme foi crescendo esse dom foi se aprimorando, e quando finalmente adulto obteve o dom completo da poesia. Mas de que adianta ter o dom da poesia nesta época?

A poesia é algo belo, é uma virtude valiosa. E, no entanto, nada vale nesta nossa atual realidade! Muito pelo contrário, o poeta é ridicularizado, chamado de vagabundo. Caso ele diga, com orgulho, que é poeta, as pessoas irão rir dele. Então, de que vale a poesia?

Vemos referências no livro que lembram Augusto dos Anjos, como por exemplo nos seguintes versos do poema ALPHA III: “E eu, que nas fileiras de Esparta fiz a minha morada / Encaro a luta de frente, rei deposto pela ira dourada / Pensando que se a vida é uma ilusão, que assim seja / Pois que a mesma mão que toca, é aquela que apedreja”. Mas Cichetto apenas se assemelha a Augusto, e essa semelhança ele mesmo faz questão de demonstrar, como admiração, talvez por Augusto ser tão atual em tempos modernos, porém a influência real de Cichetto vem de Lou Reed, que ele mesmo admite como sendo um ídolo de nossos tempos.

Mas o que sentem as pessoas próximas ao poeta? Será que elas se sentem ofendidas? Ou agradecidas por tomarem um gole de verdade? Creio que dificilmente uma pessoa comum iria brindar com uma taça transbordando de verdades. Isso é coisa para os raros. E Cichetto é raro. Ele simplesmente lamenta que o próximo o rebaixe, porque ele é poeta, e só um poeta tem a consciência de enxergar o que, de fato, é fútil. E simplesmente caminha em direção oposta à futilidade, como no poema “LAMENTO”, nos seguintes versos: “Lamento por não ter eu tirado dos que tinham / E por ter ido na direção de onde todos vinham.”, “E lamento muito, por acreditar em livros e poesia, / Mas muito mais ainda por não aceitar a hipocrisia”. Vemos aqui a incorruptível poesia, com sua pureza extraída da mais profunda beleza, mesmo rodeada de uma hipocrisia que fede (toda hipocrisia fede).

Mas se vocês me perguntam quem é o autor de “Troco poesia por dinamite”, eu diria, sem dúvida, que é a pessoa que escreveu o poema “Super-Homem, A poesia”. O poema mais belo dessa obra.


Toda a magia e encanto por trás de um poeta, toda a crença de que um poeta é um ser iluminado, um ser divino, toda essa concepção fantasiosa cai por terra nos versos de Barata Cichetto, para ganhar uma dimensão bem mais profunda. O livro é o exemplo atual de que o poeta é uma pessoa comum, como qualquer outra. E que a pessoa comum tem mais magia e encanto em sua profundidade, do que os acadêmicos fazedores de versos que se acham divinos. O escritor não é um ser intocável. É pessoa comum. Ele come, bebe, caga, fode. E pode dormir bêbado na rua. A beleza da poesia está no que a pessoa comum faz, e o poeta que tem esse dom de extrair beleza de coisas comuns, ou por vezes repugnantes, é o verdadeiro poeta. Ele não precisa ser divino ou mágico. O poeta é apenas um poeta. E é exatamente isso o que as pessoas comuns, dessas que acreditam em poetas divinos e intocáveis, não conseguem entender. Perguntam: “mas como ele consegue fazer esses poemas?”. Esse é o dom do poeta. Nasceu com ele, foi aprimorado por ele, e vive dentro dele. A poesia é o seu tesouro que todos ambicionam ou admiram, mas que para o poeta é coisa comum. Porque é um poeta, simplesmente.

Barata Cichetto não fala de flores, poesia “bonitinha e colorida”. Ele é autêntico. Fala do que sente e do que vive. Seus versos de “PORQUE EU NÃO FALEI DAS FLORES” traduzem bem isto: “Não, não quero falar sobre bondade, beleza e cheiros doces / Quero dar murros nas cabeças de idiotas, tratar aos coices / A parte boa de mim é má e meu lado pueril é cheio de rugas / E se tenho que falar de algo, será sobre os ratos e as pulgas”.

E toda essa sinceridade, toda essa realidade, é um murro na cara. Tanto que o próprio poeta sente-se preocupado com o que será da poesia amanhã (se é que existirá algum amanhã). A poesia está morta? Ou ela fala do mundo dos mortos, sussurrando ao ouvido do poeta, que vive num mundo perdido do qual a própria poesia desistiu de acreditar? O que pensar dos seguintes versos de “PÁTHOS E THÁNATOS”?

“Dormes enquanto escrevo sentimentos de destruição / Alheia ao que nos cerca, um mundo de prostituição / E enquanto dormes eu morro de tristeza e de agonia / Certo que amanhã de manhã não haverá mais poesia”.

E a máxima do poeta, é a transfiguração de valores em que vivemos atualmente. No fundo, o leitor sabe que concorda com o que lê, que deseja viver livre, mas o peso do arrependimento parece ser o mesmo do enorme peso de suas obrigações para com a sociedade. Nesse sentido, podemos apenas refletir nos seguintes versos de “MEU OUTRO FIM”:  “Que existência de merda a minha, de esposa e filhos / Uma carreira de trabalho, e vida correndo nos trilhos / Poesia feita a lápis, fogo em meus livros de ocultismo / E eu ainda acreditando no poder único do catolicismo”.

Eu não poderia deixar de finalizar este artigo com dois versos desse livro que, como uma mensagem, trazem uma reflexão que recai no próprio leitor que sabe o que sente. E se sente algo, é porque a poesia fez seu trabalho, e o poeta soube servir bem à sua deusa poesia. Então, por aqui termino com os versos finais de “QUE EU DESCANSE EM PAZ”:

“E se agora depois da minha morte esta poesia lhe traz emoção / Que eu descanse em paz, recompensado pela minha devoção.”.

23/03/2015

Prefácio ao Livro "Algum amanhã de merda que para sempre já morreu"

Prefácio ao Livro "Algum amanhã de merda que para sempre já morreu", de autoria do Sr. Arcano
Luiz Carlos Cichetto


"Não entre, não leia minha mente. Com minha imaginação, eu lhe possuo..."  A frase acima, retirada de uma das suas próprias crônicas, define o perfil (palavra tão desgastada nos dias correntes) desse escritor que aos trinta e cinco anos coleciona e conta historias de uma forma extremamente sincera e portanto inquietante, crua e rude.

Anjos e toda sorte de demônios, putas e toda sorte de criaturas cruéis e doces, além de toda sorte de seres sem sorte ou sem morte, fazem da literatura do Sr. Arcano, algo por demais excitante intelectualmente e, porquê não, sacana.

Por vezes, nessas crônicas, o leitor que é sempre lembrado de seu papel e tratado com respeito e atenção, poderá perder a paciência com o autor por causa de sua extrema sinceridade e crueldade. Por não ser tratado apenas por um idiota mal letrado que busca na literatura o remédio para a insônia ou para a falta (ou excesso de sexo), E também por ter a todo momento a visão abominável das suas (as dele próprio e as do escritor) vísceras expostas.

Normalmente um escritor de crônicas é por demais egocêntrico, como de resto todo escritor de qualquer estilo o é. Mas o nosso Sr. Arcano, ao retratar de forma intensa, por vezes poética e sempre com excelente talento literário, todo o sentimento solitário da mente humana, converge ao solidário. Pois é na solidão do ato de falar sobre si mesmo, que o escritor cria ao seu redor o real sentido de solidariedade.

Luiz Carlos Barata Cichetto
25/02/2015