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30/11/2019

Capacho

Capacho
Barata Cichetto



Então, vadia, quer apanhar na bunda,
Que eu te chame de porca vagabunda,
Ou quem sabe te bater na cara de vaca,
E riscar teu rosto inteiro com uma faca?

Posso te comer na rua encostada no muro,
E enterrar nas tuas pregas meu pau duro,
Morder tua jugular feito vampiro de cinema,
E depois te jogar na sarjeta cheia de edema?

E então, piranha, que tal acha de eu te esfolar,
Amarrar teus pulsos e te fazer ainda esmolar,
Gostaria de ser amordaçada e depois chupada,
Até sentir ser pelo seu flagelo a única culpada?

Eu posso dar o que quer desde que queiras,
Mas depois não saia por ai falando asneiras,
Peça e dou, implore e te como feito macho,
Só não seja infiel e não me faça de capacho.

24/11/2019
©Luiz Carlos Cichetto - Direitos Autorais Reservados

28/11/2019

Foi Uma Puta Que Me Disse

Foi Uma Puta Que Me Disse
Barata Cichetto


Tem muita coisa que eu sei, e que não aprendi em uma Faculdade. Aliás, o mais próximo que cheguei de uma foi cerca de cem metros, num puteiro que tinha próximo ao Largo de São Francisco, onde tem a gloriosa Faculdade de Direito, que formou presidentes, políticos famosos e até estandartes da Literatura. Ali, não na Faculdade, mas no Puteiro, foi que dei meus primeiros passos em direção à Filosofia e a Poesia, o que é praticamente a mesma coisa. E também à Putaria, outra ciência insofismável.
Tem muita coisa que aprendi, mas não nos bancos limpos da Academia, nas camas sujas da Casa da Tia. Troquei professores letrados, trajados de terno ou camiseta rasgada, onde toda a verborragia gelada da humanidade e citações quilométricas de outros acadêmicos são encaradas com bocejos, cervejas e maconha na calçada, por putas desregradas, trajadas de minissaias e botas de cano alto, que desfilavam toda a sabedoria que mantinham quente no meio das pernas, e que são encaradas com desejo, cachaça e cigarro, bem ali mesmo.
Tem muita coisa que sei por que aprendi, mas nunca nos guetos ideológicos dos centros acadêmicos dessas faculdades de ciência nenhuma, doutrina marxista pura e filosofia pragmatizada. Aprendi nos guetos fisiológicos dos quartos de quatro metros quadrados, anti-higiênicos, endêmicos, desses puteiros, onde toda a ciência do universo e toda descoberta está na nudez e na embriaguez de perdidos sem glória, que fazem da própria história, sua formação, e onde o diploma chega junto com a capacidade de sobrevivência.
Tem muita coisa que aprendi, e que uso, feito uma cueca, diariamente como um escudo contra a estupidez e a arrogância acadêmica, que prega a Liberdade sem saber sequer onde fica a favela mais próxima; que prega revolução sem sequer saber amarrar os próprios sapatos. 
Aprendi e agora sei o que é Filosofia, e a pratico fora da lei, mas dentro da Lei, para desespero dos adoradores de canudos, de Canudos e de Zumbis. Sou e pratico a Filosofia, de acordo com sua mais literal e crua definição. E isso é o que me basta. Nunca fui a uma Faculdade, foi dito, e não por falta de poder, mas por ausência de querer. Quase todas as coisas do mundo são opcionais, exceto é claro as impostas por força de armas e violência física, então fiz a minha.
E se agora sei, porque não aprendi na Faculdade, mas no Puteiro, que o Comunismo é contra a essência humana, que o Capitalismo é desumano, e que qualquer Sistema é injusto e cruel, e especialmente, que qualquer Individuo, consciente de sua própria individualidade, é um perigo maior que um exército.
Ah, sei por que aprendi nos livros, que no final das contas são meras putas. E isso foi uma puta que me disse.

27/11/2019
©Luiz Carlos Cichetto - Direitos Autorais Reservados

26/11/2019

Solidão Bucólica

Solidão Bucólica
Barata Cichetto




Quero saber do teu decote e da tua imaginação inescrupulosa,
De teus olhos melancólicos, e da tua boca tremida cor de rosa.
Onde passam teus cabelos jogados no rosto ao sabor da brisa,
E saber por quem tremem suas narinas, e tua mente indecisa.

Quero saber dos teus pés ligeiros, dos teus cheiros e sabores,
Entender o que pensa, saber onde te dói, cheirar teus odores.
Dizer-te que te quero, às seis da manhã, e às quatro da tarde,
E te possuir por trás, pela frente e soprar a ferida que te arde.

Quero querer, te amar ou te foder, usar palavras com poder,
E se não for te pedir demais, não deixar jamais de te comer.
Na solidão bucólica de teus desejos espero feito um monge,
Paciente e derretendo minhas asas de plástico ao sol longe,

Quero saber, apenas por saudades multicoloridas maiores,
Sobre teus desejos íntimos, detalhes ínfimos e pormenores.
Quero ser teu amigo constante, e amante por antigo prazer,
Mas apenas posso dar em troca aquilo que possa me trazer.

25/11/2019
©Luiz Carlos Cichetto - Direitos Autorais Reservados

25/11/2019

Ah, Sim, Eu Tenho Uma Carreira

Ah, Sim, Eu Tenho Uma Carreira
Luiz Carlos Cichetto


Em Novembro de 2019, completo quarenta e cinco anos de carreira literária, pois considero a data da minha primeira publicação, ainda num daqueles veículos underground impressos em mimeógrafo. Antes disso, meus poemas e contos não saiam da caixa de sapatos ou do caderno. Novembro de 1974. Eu tinha 16 anos, e um monte de coisas escritas, mas eram apenas coisas de adolescente.

De qualquer forma, chamar de "carreira literária" é quase uma zombaria comigo mesmo, já que fora as auto-publicações artesanais, jamais consegui ser publicado por uma editora "de verdade", e quase nenhum dinheiro recebi com meus escritos.

Comemorar? Não, talvez apenas relembrar uma data, olhando para as pilhas de folhas impressas que empoeiram no meu armário, e que um dia, quem sabe num futuro em que eu não possa estar, seja a panaceia de alguém, que hoje ignora tanto meu trabalho quanto minha pessoa.

Nunca pleiteei nada que não fosse meu por direito, e isso inclui reconhecimento a um trabalho intenso, grande e vasto.

Meu sentimento é de que, findo este ano de 2019, tudo isso cesse, que eu não fique mais esperando o resultado de um email enviado a uma editora, de um concurso literário ou de qualquer migalha de uma curtida em rede social. Escrever sempre foi minha vida, e só há um meio de acabar com isso.

20/11/2019
©Luiz Carlos Cichetto​ - Direitos Autorais Reservados

Sol_Angel

Sol_Angel
Luiz Carlos Cichetto



Na ponta dos pés o homem entrou na cozinha, que era simples e com poucos utensílios. A mulher, trajada também simplesmente não percebeu sua chegada, entretida nos seus afazeres. Ela estava descalça e cantarolava alegremente, enquanto mexia nas louças da pia. Uma blusa cor-de-rosa de alça, com um grande decote deixava à mostra o colo dos seus seios, pequenos, mas de bicos pontiagudos.  
Ele se se encostou às nádegas da mulher e seus braços, magros e longos envolveram sua cintura. Ela fez que não percebesse, mas apertou a bunda de encontro ao pau dele, que a essa altura também estava duro.
Com delicadeza, mas firmemente ele abriu o zíper da calça comprida dela e desceu até o meio das coxas, magras, mas firmes. Ela soltou um gemido, que parecia um ronronado de gato, e jogou o pescoço para trás.
As mãos do homem, de dedos longos e finos percorreram o meio das pernas tateando a calcinha, que era um pouco gasta. Em segundos a calça jazia entre os pés da mulher e sobre ela a lingerie branca. Sua boca lhe percorreu o pescoço, depois a orelha. A língua desenhava círculos na pele dela, que se arrepiava a cada movimento.
Sem dizer nada, a mulher apoiou as mãos, que ainda estavam molhadas, na pia e ergueu os quadris. Toda sua pele tremia de desejo, suas pernas bambeavam e a vagina estava tão molhada que ela percebia uma gosma quente a lhe escorrer.
Em silêncio, o homem abriu o cinto de sua calça com rapidez e a desceu juntamente com a cueca, chutando-as para longe. Abraçou-a, apertando delicadamente os seios, ergueu-lhe os cabelos e mordiscou-lhe a nuca.  Sua respiração estava ofegante, descompassada e um vermelhidão tomava conta de seu rosto.
A mulher abriu as pernas num convite, e ele a segurou pela cintura e penetrou, calma e mansamente. Seu pênis ereto entrava e saía em movimentos que pareciam de um bailado, cuidadosamente ensaiado, acompanhando o mover das ancas dela, para frente e para trás.
A vagina dela estava quente e úmida, pois há muito esperava por aquele homem misterioso por quem ela sempre tivera desejo, e que agora aparecia ali, na sua cozinha, e a possuía como ninguém a tinha possuído até então. Era firme, seguro, forte, mas sem violência, e a possuía no sentido mais claro, tirando dela todo o prazer que jamais imaginara ser capaz.
Sua língua a percorria por onde era possível alcançar, seus dedos se enroscavam nos pelos da vagina dela. Seus gemidos agora eram tão altos que temeu acordar a vizinhança. Há quanto tempo ela esperara por aquilo, nem sabia dizer.
Depois de cerca de uma dúzia de minutos, o êxtase. Primeiro ela sentiu um choque elétrico, um orgasmo como nunca tinha sentido antes, percebeu que seu corpo inteiro tremia com aquele prazer. No mesmo momento, sentiu um jato quente lhe penetrar, como se fosse lava de um vulcão. O homem soltou um urro e a abraçou mais forte, quase esmagando-a contra a pia.
Delicadamente ela a virou de encontro a ele, olhou-me bem nos olhos e ameaçou dizer alguma coisa, mas se calou e beijou-lhe as pálpebras e o rosto, deu alguns passos e apanhou a calça e cueca num canto, vestiu-se e saiu, deixando a porta aberta.
Atrás de si, a mulher ficou parada, certa de que aquilo era apenas um sonho. Ou não...?

31/10/2019
©Luiz Carlos Cichetto - Direitos Autorais Reservados

Segredos

Segredos
Barata Cichetto



Pergunta se um segredo nos torna maiores,
E te respondo que jamais seremos menores:
Segredos nos fazem cúmplices das verdades,
De acordo com as nossas próprias vontades.

25/11/2019
©Luiz Carlos Cichetto - Direitos Autorais Reservados

24/11/2019

Bastião do Paraíso

Bastião do Paraíso 
Barata Cichetto
(Bastião: Obra avançada de uma fortificação, com dois flancos e duas faces; lugar completamente seguro; pessoa que luta por uma causa; defensor.)


Sua respiração acelerada é o desejo pulsante,
Minhas palavras te desejam, delícia delirante,
E se tuas pernas tremem e tua pele enrubesce,
É o desejo libertador que na tua alma floresce.

Pense em mim no chuveiro e use seus dedos,
Enquanto espero escondido de teus segredos.
Caminhe pela praça deserta do Paraíso, nua,
Que te espero armado no outro canto da rua.

Acorde de manhã, sentindo o pulsar do coração,
E sinta no meio das pernas um ligeiro comichão,
Depois se entregue ao desejo puro de quem vive,
E não ao desespero parco daquele que sobrevive.

Teus lábios tremulam, tuas narinas se distendem,
Há tolos que se contraem, outros que te prendem,
Enquanto eu, do prazer soldado ferido sem glória,
Luto por seu desejo, na maior batalha da história.

24/11/2019

Calcinha Vermelha no Banheiro

Calcinha Vermelha no Banheiro
Barata Cichetto



Tua calcinha vermelha, no banheiro pendurada,
É a bandeira de uma luta que acabou empatada.
Tomei teu território como um nobre conquistador,
E nas tuas terras finquei o meu mastro libertador.

Dominei teu desejo selvagem com a espada afiada,
Escutando os gritos de quem tinha sido desafiada.
Arranquei as bandeiras de seu território inexplorado,
E desnudei terras santas como bárbaro abandeirado.

Entregaste-me teu precioso tesouro sem resistência,
E nas tuas costas, de praias desertas, fiz residência.
Percorri tuas matas e desci pelos teus rios inóspitos,
E descobri segredos puros guardados nos depósitos.

E tua calcinha vermelha no banheiro hora pendente,
Repousa satisfeita junto com a tua escova de dente.
Enquanto durmo ao teu lado cansado da conquista,
Satisfeito e pelado, com o prazer livre de anarquista.

24/11/2019
©Luiz Carlos Cichetto - Direitos Autorais Reservados

21/11/2019

Virtual

Virtual
Barata Cichetto




Não era para ser assim, mas foi mesmo sem ser. Não era para gozar sem eu ver. Não era para ser assim. Era para eu sentir tua carne tremendo, teus olhos revirando, teus lábios se espremerem e tua respiração ofegante. Era para eu sentir seu coração pulsando, fazendo os bicos dos teus seios ficarem duros e escuros. Mas foi assim mesmo, sem que de outro jeito pudesse ser. Não era para ser pelas teclas do computador, mas pelos meus dedos, não era para ser pela tela, mas pela pele; não era para ser apenas por palavras escritas, mas sussurradas nos teus ouvidos. Não era para ser assim, mas foi, e de outro jeito não poderia ser. Não era para ser tão longe, não era para ser sem ruídos, nem suores e sem outros líquidos, era para nos escorregarmos um no outro, nos lambuzarmos de tudo que fosse líquido. Não era para ser pela imaginação, mas pela respiração, não era para ser cada um com sua mão, era para serem quatro mãos em dois corpos, esparramados pelas nossas peles. Era para serem duas bocas grudadas: boca em boca, boca em qualquer lugar, em que pudéssemos grudar, chupar, colar. Não era para ser assim, mas foi. Era para serem pernas e braços enroscados, colchões rasgados e travesseiros arrancados. Era para ser subir e descer, descer e subir. Um sobre outro, outro sobre um. Um embaixo do outro, outro embaixo de um. Em cima, embaixo, do lado, de lado. De qualquer lado e em qualquer posição. Era para chupar, não imaginar. Era para lamber, não pretender; era para gozar, não apenas para sonhar. Não era para ser assim. E um dia não será assim. Ou não?

21/11/2019
©Luiz Carlos Cichetto - Direitos Autorais Reservados

19/11/2019

Lápis de Cor (Reflexões Sobre o "Dia da Consciência Negra")

Lápis de Cor
(Reflexões Sobre o"Dia da Consciência Negra")
Barata Cichetto




Eu queria apenas desenhar, pintar o mundo com todas as suas cores. Fui a uma papelaria e comprei uma caixa de lápis de cor, com uma dúzia. Doze cores seriam o suficiente para eu expressar minhas emoções, dar vazão à minha criatividade, expressar minha arte. Deixar ao menos um pedaço de papel colorido, que fosse sobre alguma mesa de plástico, ou numa rua de asfalto.
Cheguei em casa, desembrulhei o pacote, abri a caixa e fiquei olhando para os lápis redondos, coloridos, todos do mesmo tamanho, alinhados elegantemente dentro da caixa de papelão, e pensando sobre as maravilhas coloridas que faria com eles, e que poderiam encantar crianças, idosos, e dar-lhes um pouco de cor.
Aí me lembrei do mundo chato e intolerante, e fui logo tirando da caixa o preto, já que eu poderia pintar algo com ele e ser acusado de racismo. Por via das dúvidas, e pelo mesmo motivo, joguei fora também o marrom. Ficaram apenas dez lápis na caixa, mas era o suficiente para eu pintar o mundo.
Então percebi que tinha que jogar fora também o bege, pois eu poderia também ser tachado de racista, acaso me distraísse e pintasse uma pessoa com essa cor. Por aproximação, foi também o rosa, que tinha o agravante de que eu poderia ser acusado de machista ao pintar alguma coisa feminina com ele.
Ah, mas eu ainda tinha oito lindos lápis de cor, que comprara simplesmente para fazer arte, e quem sabe dar alegria a algumas pessoas, ou no mínimo me expressar, colocar em cores meus sentimentos mais bonitos.
Oito... Mas tinha o verde escuro e o amarelo, e pensei que seria condenado como fascista se pintasse algo com eles, já que são as cores da bandeira brasileira. 
Sobraram seis, só a metade do que comprei. Apenas metade das cores que eu poderia usar para pintar e descrever o mundo. Ainda acreditei que seria o suficiente, já que o mundo não anda tão colorido atualmente.
Eu disse seis? Não, tinha o outro tom de verde mais claro e o azul, que também foram descartados pelo mesmo motivo. Resolvi, para evitar maiores problemas, juntar a eles também o azul mais escuro.
Olhei para a caixa de lápis de cor quase vazia, onde jaziam apenas três lápis: o lilás, o vermelho e o laranja.
O vermelho foi logo quebrado e atirado no lixo, que poderiam me chamar de comunista, caso eu pintasse alguma coisa com ele. Por inércia a próxima vitima foi o laranja, e por fim o lilás, que poderia sugerir alguma espécie de homofobia, ou o oposto, alguma apologia à imoralidade.
Cores e palavras são coisas que nasceram para representar a liberdade, algo um tanto perigoso nos últimos tempos.
Olhei para a caixa de lápis vazia com uma enorme tristeza, já que não poderia mais colorir nada desse mundo. Não havia mais cores, apenas uma caixa vazia de lápis de cor. Amassei e joguei a inútil embalagem no lixo, depois voltei à papelaria e comprei apenas um lápis, da única cor que eu poderia pintar este mundo: um lápis cinza.
Mas era tarde demais, eu não queria mais pintar.

18/11/2019
©Luiz Carlos Cichetto - Direitos Autorais Reservados


18/11/2019

Mecânico de Palavras

Mecânico de Palavras
Barata Cichetto



Antes eu sabia, ou ao menos pensei, saber lidar com as palavras. enfileirar, empilhar, entrincheirar. Ordenadamente ou desordenadamente. E eu sabia mexer com elas, chamá-las de lindas, gostosas e putas. Elas nunca se mostraram preocupadas com qualquer adjetivo que eu usasse em relação a elas. Por horas se aconchegavam, por outras se afastavam... De acordo com o meu humor e disposição de cortejá-las. Nunca foram levianas comigo, mas sempre sedutoras, embora indóceis e extravagantes. Eu as amei por décadas, cometi loucuras e até crimes por causa delas. Crimes contra mim mesmo, ressalto, nunca contra elas. Ao menos nunca crimes dolosos. Dolorosos pode ser... Até que um dia, eu pensei que as poderia abandonar, e feito amante furtivo, saltei pela janela que eu mesmo pintei na parede. Sumi. Desapareci. Entretanto, quanto mais distante eu ia, mais alto eram seus soluços de saudade. Quando mais eu me afastava, mais sentia falta daquele afago em meus ouvidos. Voltei. A estrada é longa. Há uma placa que me diz: vai, poeta, vai pintar seus quadros, mas nunca esqueça das palavras, razão maior da sua existência. Voltei!
Quando o vento bate na bunda a gente aprende a voar! Quando o verbo inunda, a gente tem que aprender a bradar!

©Luiz Carlos Cichetto, 18/11/2016, Direitos Autorais Reservados
Publicado no Facebook originalmente em 18/11/2016

16/11/2019

Assombração

Assombração
Barata Cichetto




Minha casa é assombrada, conta um padre exorcista,
E acrescenta que é o espírito imundo de um artista.
Ora, ora, senhor padre, esqueça seus demônios santos,
Pois o espírito sujo que aqui habita em todos os cantos,
É de quem ainda vivo foi arrancado a força o coração:
Sou eu o tal fantasma a quem chama de assombração.

12/11/2019
©Luiz Carlos Cichetto - Direitos Autorais Reservados

O Que é Isso, Companheira?

O Que é Isso, Companheira?
Barata Cichetto

Arte: Hamza Nesrate


Ela passou mais de um ano pedindo a liberdade ao ladrão,
Político que roubou a terra e portanto não merecia perdão.
Chegou a dormir na calçada, e comeu pão com mortadela,
E quase gozou quando o desgraçado lhe acenou da janela.

Dormiu até com deputado da oposição cheio de dinheiro,
Para ir até a cidade gritar pela liberdade do companheiro.
Ela sabia quem ele era, e que perderia toda sua dignidade,
Mas aceitou transar, apenas para justificar a necessidade.

Comprou camiseta vermelha com a estampa do milionário,
Acreditando que o mentiroso era pobre, portanto solidário.
E acreditou tanto, que tatuagem na perna deixou esculpir,
Pintou no rosto uma estrela e foi para a rua cagar e cuspir.

A dignidade de mulher, a custo conquistada por outras damas,
Ela jogou no chiqueiro onde porcos imundos fizeram de camas.
Xingou pai de fascista, mãe de egoísta, e achou ser comunista,
Sem saber o preço de nada, e nunca pagar a conta do dentista.

Chamou a todos de racista sem perceber seu próprio conceito,
E de nazista a qualquer um que discordou do seu preconceito.
Numa arrogância peculiar, em defesa das chamadas minorias,
Demonstrou ignorância acreditando em igualdade por teorias.

Pintou o cabelo de roxo, cor-de-rosa e depois de amarelo,
Na base da nuca mandou tatuar uma foice e um martelo.
Colocou piercing de estrelas nos mamilos, e calçou coturno,
E xingou de fascista o padeiro, e de gado o guarda-noturno.

Brigou pelos privilégios que se arvorou de forma vil e arrogante,
E pelo direito de ter livre a esquerda ao descer a escada rolante.
Fez da esperteza seu dever, pilhar e roubar agora era ocupação,
E cobrar aluguel dos desvalidos, o que chamou de participação.

Gritou palavras de ordem e por ordem de alguém pichou muros,
Sem nunca conhecer a real razão por trás de tempos tão duros.
Por sua própria vontade aceitou o imposto por cerebral lavagem,
E assim deixou de ser uma pessoa, e virou apenas uma imagem.

Deixou de usar sutiã, maquiagem e depilar o suvaco e as pernas,
Crendo em mentiras que por bocas rotas viram verdades eternas.
Namorou traficante, fumou maconha e deu tiro de fuzil na favela,
Ficou tão bêbada que deu para doze acreditando ser uma novela.

Trocou o sentido das palavras e matou da língua seu significado,
Berrou em nome da liberdade, sem saber que a tinha sacrificado.
Chamou autoridade de opressão e de pai o malfeitor sacripanta,
Mas nunca chegou em casa depois de estar pronta a sua janta.

Acreditou na justiça pelos seus olhos, e assim a tudo sacrificar
E o que era o errado virou certo desde que pudesse lhe justicar.
Seu corpo eram suas regras e assim aborto virou revolucionário,
E virou dívida e direito aquilo que era apenas um ato partidário.

Exaltou o genocídio de acordo com a necessidade da revolução,
Acreditando que o importante era a causa e nunca seu coração.
Se indignou com a morte do moleque que matou um policial,
E na estação colocou fogo no Museu que não tinha fim social.

Quando enfim o bandido deixou as grades, sonhou ser dama,
E acordou molhada com um cadáver aos pés da própria cama.
Tinha tanta fé naquele que acreditava ser seu novo Salvador,
Que não percebeu o sangue escorrendo das mãos do ditador.

09/11/2019
©Luiz Carlos Cichetto - Direitos Autorais Reservados

Barata: Feio, Sujo e Malcriado

Barata: Feio, Sujo e Malcriado
Barata Cichetto



Fui chamado de bruxo, de idiota e também de guerreiro,
E fui criado sem luxo, na pancada, e jogado ao terreiro.
Quiseram-me morto, antes mesmo de cinquenta e oito,
Não fosse por um desejo mórbido de acolher seu coito.

Fui chamado de coisas piores e até melhores que deus,
Mas nunca quis ter olhos claros igual aos de europeus,
Ou do neto predileto do senhor das porcas e madonas,
Que ganhou as medalhas sem nunca correr maratonas.

Já fui chamado de bicha, pervertido, e até de homem de fé,
E se não aprovaram minha sina, nunca pagaram meu café.
Me chamaram vagabundo, mas nunca atendi às chamadas,
Xingaram-me de imundo, mas eram as porcas mal amadas.

Ah, minhas putas invertidas, que fiz musas por mero acaso,
Devem-me o gozo, com multas e juros pelos anos de atraso.
E agora quando me chamam de bardo bastardo sem glória,
Digo fodam-se, e que escrevam direito sua própria história.

05/11/2019
©Luiz Carlos Cichetto - Direitos Autorais Reservados

Habeas Corpus

Habeas Corpus
Barata Cichetto



Sou poeta das lutas extremas,
Por rainhas loucas vomitadas.
O profeta de putas supremas,
E das rimas toscas limitadas.

20/08/2019
©Luiz Carlos Cichetto - Direitos Autorais Reservados

14/11/2019

Eu Quero Sexo!

Eu Quero Sexo!
Barata Cichetto



Eu quero sexo! Dinheiro e poder são coisas de quem não presta. Não me interessa. Quero o gozo molhado, o gemido sincero e o grito de tesão. Quero sexo. Quero trepar e o resto não tem pressa. Mas não quero o gozo das artistas, nem das feministas e nem das comunistas, com seu gozo coletivo e seu orgasmo social. Quero uma bela gozada sexual. Sem política, sem ideologia e sem partido, Uma bela gozada e pronto. Cada um no seu canto. Um gozo sem bandeira, sem compromisso, sem votar em presidente, sem escolher a cor da camisa. Uma bela trepada e pronto. Uma chupada aqui, um dedo ali. Uma lambida aqui, uma cuspida ali. E gozar como se não existisse lá fora um mundo tão dividido em ideologias, credos, crenças, e uma infinidade de coisas que nos tiram o desejo de trepar. Quero o gozo sem partido, o orgasmo consentido, o jorro sem permissão. Quero foder, trepar, gozar, sem carteira de motorista, titulo de eleitor e autorização de ninguém. Quero apenas prazer, sem pagar a taxa, assinar o contrato, filiação partidária. Quero foder por foder, não por capitalismo ou socialismo, apenas por vandalismo sexual, pichar a pele com uma esporrada, pintar de verde ou de amarelo, roxo, azul ou vermelho. Chupar uma buceta peluda ou pelada sem ser um flagelo contra o humanismo, o comunismo ou o plurarismo. Quero foder sem catecismo, trepar sem maldade e gozar apenas por felicidade. Gozar é um puro ato da mais simples liberdade.

13/11/2019
©Luiz Carlos Cichetto - Direitos Autorais Reservados

11/11/2019

Do Inconveniente de Ser Barata

Do Inconveniente de Ser Barata
Luiz Carlos Cichetto



“'Desde que estou no mundo' – este desde parece-me carregado de um significado tão assustador que se torna insuportável." A citação é de Emil Cioran, o filósofo romeno, e cai como uma luva ao presente texto, até por que termina com "insuportável", que seria outro título que tinha pensado ao estabelecer a linha condutora, sobre de que forma palavras com a letra "i", tem sido presentes na minha existência. Preferi entretanto, sacanear o Oscar, com sua "A Importância de Ser Prudente" (The Importance of Being Earnest"), além do romeno. 

Desde minha avó, passando por minha mãe e duas mulheres, todas com nomes iniciando com "i" , essa letra me persegue, me espreita, me define e me consome, às vezes todas as coisas ao mesmo tempo. E ser "inconveniente", por horas me parece ser uma dádiva, dada por alguma deusa pagã, outras a maldição de uma prostituta anã, mas é certo que a inconveniência da minha existência a torna muito mais inexistência, no sentido filosófico ou científico estrito, ou religioso, no lato. Ou o oposto, que é tão verdadeiro como inconveniente.

Como definir melhor um ser que sobreviveu à sanha de um aborto, e que quando criança era chamado "asa negra" por sua própria mãe, e que era espancado por um pai que nem a desculpa de ser alcoólatra, como na maioria desses caso têm? E que foi batizado por escolha desse mesmo pai, getulista e adhemarista, com o nome composto de um líder comunista que ele odiava? Parece-me conveniente que eu me defina então por "inconveniente". 

De inconvenientes atitudes a inconvenientes palavras, cresce o ser, sempre com a boca machucada por tapas convenientes e as costas feridas por convenientes surras de ripa de madeira. Uma educação convenientemente tratada como sagrada. 

E o inconveniente passa a ter significados amplos, sinônimos múltiplos, na conveniente sociedade crescente, carente de conveniências, todos com a tal da letra "I". Impertinente, importuno, impróprio, inadequado, inapropriado, indiscreto, inoportuno, indecente, imoral, indecoroso, inferior, inútil, incômodo. Cada palavra com seu conveniente expediente, cada uma mais eficiente que a outra.

Da inconveniente poesia suja, ao inconveniente namoro com puta suja, do inconveniente gosto pelo Rock sujo ao casamento com uma suja sem Rock e sem poesia; do inconveniente de ser pai ao de ser fiel; da inconveniente forma de tratar a fidelidade e a paternidade, ao inconveniente jeito de tratar a felicidade e a eternidade, chego ao inconveniente máximo de ser Barata, o símbolo máximo da inconveniência doméstica, social, urbana. E ademais com um inconveniente dom de resistência. Intolerável inconveniente, insustentável impertinência, indefectível intermitência, impossível intendência, inexprimível inconsequência. Gritaram: "Inexequível", "Impossível", mas era incontestável a inexorável, inflexível, implacável ira, a inelutável, irrefutável e indiscutível intenção: invencível, e até incrível.

Barata dos Infernos, O Insuportável Barata, e inomináveis substantivos e adjetivos. Superlativos, mas inobjetivos. Insofismável, incontestável. Incerto? Inconstante? Imbecil? Idiota? Nunca à imagem: inverossimilhança. Inexpugnável. Intragável. Indubitável inteligência, inacatável pertinência, indisputável clarividência. E de inconvenientes a inconsequentes, de indecentes a impertinentes, escrevo, escrevo, escrevo. Nada devo ao que escrevo. Nada invento, nada intento. De fato não escrevo, mas inscrevo minha intenção nessa pedra girando no Universo. Não apenas o verso, mas seu inverso e seu reverso. Converso apenas. Inconvenientes e inconiventes conversas; intransitivas e intransceptivas conversas. Inversas. Invenções, introversões, inversões. Invento novo verso, intento novo inverso. Sem reverso.

"Um dos artistas mais instigantes, inteligentes e imprevisíveis - só para ficar nos adjetivos começados com a letra "i" - que conheci pela Internet." - Disse o escritor, que também é professor, e que também é crítico literário. "Imponderável, impertinente e inconsequente", disse outro. "Intangível e insaciável", por fim disse eu, ao final de uma conversa que inexistiu.

E insuportável agora, ao final da inglória inexistência inconveniente, incontinente e imediatamente, ainda inabalável e intocável, me torno incontestavelmente inverossímil, infactível, inexprimível. 

©Luiz Carlos Cichetto  - Direitos Autorais Reservados

11/11/2019


10/11/2019

Alucinação Barata na Hora do Almoço

Alucinação Barata na Hora do Almoço
Barata Cichetto



1 - Mote, Glosa e Alucinação

Eu era um garoto, amando Beatles e Rolling Stones em setenta e seis,
Quando um canto torto feito faca a minha carne cortou naquele mês.
A alucinação foi suportar o delírio cotidiano, e naquele ano colorido,
Cantei como se fosse morrer de alegria, como se não tivesse morrido.

Eu, que nunca tinha achado nada divino, e nem nada maravilhoso,
Corri pelos cantos declamando minha poesia com olhar lacrimoso,
Aguçando meu canto e meu sonho no rádio de pilha com meu bem,
E forte e tão moço, na hora do almoço, fiquei só na estação de trem.

E eu era um garoto amando as coisas do passado, armando o futuro,
Uma velha roupa colorida, tomando Cuba Libre e mijando no muro,
Poe tinha me dito, com seu corvo no umbral, nevermore nunca mais,
E não era por bem, nem foi por mal, mas lhe disse: o passado jamais.

Naquele tempo, eu nem via e nem sentia a mudança a me acontecer,
Mas sabia de cor que não podia esperar o dia inteiro até amanhecer.
Tinha aprendido nos discos like a rolling stone, Dylan e Woodstock,
O que era cruel, sonho de mel, e a vida apenas um concerto de Rock.

2  - Coração Selvagem

Faltava algum tempo para um nove oito e quatro em setenta e sete,
Populus cão fiel mordeu minha mão e eu o matei com um canivete.
Selvagem meu coração, e fui clamar pelo Luar nas areias do deserto,
Pensando ser errado o que era injusto, e imortal aquilo que era certo.

Sem ter aonde ir, e dentro da noite sem fim morri em oitenta e dois,
Mas agora entendo o que somente poderia entender mesmo depois,
Aqui Jazz meu coração, disse à mulher que nunca foi companheira,
Enterrando no peito um punhal, e sangue escorrendo pela banheira.

Ainda queria ser poeta, ainda queria ser artista, e com bolsa de couro,
E dúzias de poemas rasgados depois, troquei as rimas com um touro.
Foi-se minha lira dos vinte, foi-se a foice, o martelo e a elegia obscena.
Tinha a conta do florista, do analista e os próximos capítulos da cena.

Um dia sumi, uma noite ele sumiu, e era o fim do mundo da ditadura,
E o guarda-roupas e o carro na garagem ficaram olhando a fechadura.
Santa Cruz ou Maria ou em qualquer lugar ao norte de lugar nenhum,
Basta o nada para ser o tudo, e tudo o que é preciso é ser humano um.

Antes do Fim

Eu não era mais tão moço, e na hora do almoço tive uma alucinação:
Bechior e eu bebíamos vinho tinto, e cantávamos uma velha canção,
Uma balada falando de coisas assim, de money, de lua, e de nós dois,
Ele comentou sobre John, sobre America Latina e desapareceu depois.

Fiquei sentado à mesa posta, pratos vazios e a cabeça cheia de ideias,
E não pude nem lhe contar sobre Angela Maria e suas latinas medeias.
Belchior seguiu o caminho da morte, que traz justiça e nos faz irmãos,
Mas com palavras ainda traço o destino com o suor de minhas mãos.

05/11/2019
©Luiz Carlos Cichetto - Direitos Autorais Reservados


08/11/2019

Confesso Que Bebi

Confesso Que Bebi
Luiz Carlos Cichetto
Arte: Barata By Del Wendell

Ontem bebi como há muito tempo não bebia. Não foi por ira, por raiva, por nada demais, apenas bebi e nada mais. Bebi por Baco, por Sísifo, por mim, por ninguém mais. Não foi por Poe, pelo corvo e ninguém mais. Bebi por mim e ninguém mais. Bebi por querer, bebi por beber. E nada mais. Por querer, por ser, por viver. E nada mais. Não foi por querer estar tonto, nem pronto. Foi por querer e nada  mais.  Não foi por ter sido traído, nem por ter desistido, nada mais. Não foi por ter sido, não foi pra ter ido. Foi por ter bebido. E nada mais. Não foi por estar sensível ou achar horrível, mas por ser incrível, e nada mais. Não bebi por estar triste nem feliz, foi por que quiz. Não foi por comemorar, nem por agradecer, foi por querer.  Não foi para lembrar, nem para esquecer. Foi por querer ser, querer viver. Apenas bebi por querer, por vontade de beber, e nada mais.

07/11/2019

©Luiz Carlos Cichetto - Direitos Autorais Reservados

07/11/2019

Poemas Sacanas de Um Bêbado As Duas da Manhã

Poemas Sacanas de Um Bêbado As Duas da Manhã


Barata Cichetto - "Sexo Oral" Tinta Látex sobre Papel Paraná - 2016


(Parte 1)

E quando você acabar de jantar,
Diga se ainda tenho que esperar,
Antes de te comer e até saborear,
E se quer foder ou apenas transar.

Quero te fazer sexo oral
E chupar-te até o anal,
Mas se não faz um mal,
Eu të chupo até o final .

Se minhas palavras são raras,
Imagine então minhas taras?
Minhas intenções são claras,
E tuas todas as minhas caras.

Pouco importa se sou velho ou poeta,
Quero te comer à torto e em linha reta.
Conjurar na tua buceta, macho atleta,
E na tua cama ser tua forma predileta.

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(Parte 2)

O que pensas que é foder, minha cara?
Só gozar em ti, satisfazer minha tara?
Ou sonhas que te comer é dar-me inteiro,
E chupar e gozar como ato companheiro?
Se te chupo e como, se me come chupas,
E gozarmos juntos, a sós e sem culpas?

06/11/2019
©Luiz Carlos Cichetto, Direitos Autorais Reservados

05/11/2019

Memórias Plenas de Um Esquecido

Memórias Plenas de Um Esquecido
Barata Cichetto



Eu queria ter esquecido. De ter aparecido. Esquecer de ter sido. Esquecer de ter ido. Esquecer de ser. Até não ter mais nada por esquecer. Queria ter esquecido que o dia tenha amanhecido. Queria ter esquecido de nascer quando não me quiseram viver. Queria ter esquecido de crescer quando me quiseram pequeno. Queria ter esquecido de esquecer quando me quiseram sem memória e sem história. Quando rasgaram minha certidão queria ter esquecido de ter feito tudo que fiz. E ter sido apenas que eu tinha esquecido de ser. Esqueceram de mim feito um brinquedo depois de crescido. Esqueci-me de mim e não poderia ter esquecido. Esqueceram de mim feito um cavalo de pata quebrada. Queria ter esquecido. De ter sido pai. De ter sido marido. Queria ter esquecido de não ter traído. Queria ter esquecido de não ter morrido. Queria ter esquecido de ter sofrido. A carne é fraca grita a vaca. Do boi só se perde o berro grita o dito. E qualquer fruto maldito do teu ventre esquisito. De teus pés tortos e de tua boca imunda e vagabunda. Queria ter esquecido. De ter sido. O que não fui. Queria ter desaparecido. Nas trevas. No meio das ervas do quintal. Queria ter ferido. Com metal quem avançou meu sinal. Quem quebrou minha confiança e matou minha esperança. Queria ter enfiado um punhal na tua garganta. Na hora da janta. Logo depois do Carnaval. Te enterrado no matagal. O mesmo onde enterrou tua calcinha. Ter enfiado tua cabeça torta na mesma privada onde jogou minha filha. Queria ter esquecido o que era certo. Honrado e não ter chorado tanto. Queria ter esquecido que era bom. E ter feito das tuas tripas um coração. Queria ter esquecido de não ter te matado enquanto podia. Pasto de covardia. Poço de hipocrisia. Queria ter esquecido. De ter sofrido. De não ter morrido. De ter matado. O que podia. Enquanto podia. Enquanto fodia. Queria ter esquecido. A carteira. E ter voltado. Antes da feira. Da segunda. Ou da sexta. Queria ter esquecido. De ter ido ao trabalho. A semana inteira. Queria ter morrido atropelado. Na Paulista. À vista. Antes da entrevista. Queria ter esquecido de ser gente. E te deixar doente. Morrendo à míngua. Não ter recolhido tua sujeira. De não ter espremido. Tua cabeça feito um tubo de pasta de dentes. Queria ter esquecido. De tomar o comprimido. Antes de ter ido ao psiquiatra. Queria não ter esquecido. De ter ferido. O impreterido. Queria não ter esquecido. E ter fodido. Quem queria foder. Queria ter comido. Traído. E ter sido. Chamado de perdido. Antes de me perder. Queria não ter sabido. Ter saído. Antes da hora. Queria não ter sentido. O estômago moer. Queria ter ido ao teu enterro. Não ao meu. Queria ter carregado a alça do teu caixão. Não ir sozinho ao cemitério. Queria ter te matado. Mesmo que em sonhos. E não ficar atado. Ao meu próprio pesadelo. Queria ter querido. Queria ter preferido. Morrer. Antes de ser morto. Queria não ter parido. Queria não ter esquecido. De ter partido. Quando fui partido. Em pedaços. Tão pequenos. No teu liquidificador. Queria nãoi ter arrefecido. Meu ódio. E não ter perdido minha ira. Queria ter esquecido de ir a missa do meu próprio casamento. De ter ido ao culto ao teu deus de mentiras. De ter lido. Teu livro de mentiras e traições. Teu evangelho escaravelho. Queria ter esquecido. De ter sido extraído a força do meio do jogo. E ter sido jogado no fogo. Queria não ter queimado. No Inferno. De terno E gravata. Queria ter dito bravata. Te comido na mata. E jogado fora minha cueca. Cheia de meleca. Queria ter esquecido de ter te conhecido. E agora não precisaria querer esquecer de ter nascido. Nem lembrar de não ter morrido. E antes que eu tenha esquecido. Quero ser grato. Por ter comido no seu prato. O resto da comida. Que eu paguei. E que outro comeu. Queria não ter esquecido. Queria não ter vivido.

04/11/2019
©Luiz Carlos Cichetto - Direitos Autorais Reservados

04/11/2019

Espelho é o Inverso do Verso

Espelho é o Inverso do Verso
Barata Cichetto


O que vejo agora bailando a minha frente,
Não é o destino ou qualquer coisa diferente,
É apenas uma sombra, uma fosca mera miragem,
Neste espelho onde não encontro minha imagem.

31/10/2019
©Luiz Carlos Cichetto - Direitos Autorais Reservados

02/11/2019

Barra, Barata, Barcelos

Barra, Barata, Barcelos
Barata Cichetto



Somos três amigos. Um preto, um branco e o outro mulato,
E desafiamos aos sentidos, do estrito, do restrito e do lato.
Disseram que não podíamos ser, dividiram as nossas cores,
E mentiram que éramos menores que nossas próprias dores.

A igualdade é o que temos, a desigualdade é o que querem,
E se somos diferentes somos melhores do que nos preferem.
Insistem que deixemos de ser o que somos, da cor ao penhor,
E que assim tenhamos um único amo, proprietário e senhor.

Não somos escravos de nossas peles, corpos meras carcaças,
E assim, diferentes irmanados em nossas próprias desgraças.
Mostraram o caminho do ódio que nunca quisemos por bem.
Conceitos que não nos pertencem, e os lucros são de alguém.

Barra, Barata, Barcelos, três amigos com honradas histórias,
Profetas poetas, em outras eras cobertos seriamos de glórias.
Temos as cores, mas cores não nos culpam, e nem absolvem,
Mas por elas é que as areias geladas deste mundo se movem.

Somos três seres. E fossemos um e seriamos bem menos,
Pois querem que nós nos dividamos, não que somemos.
E por Barra, construtor que une a argamassa com cal frio,
A Barata junta-se Barcelos, o profeta com olhar de arrepio.

Penso agora sobre meu destino e em cantigas do meu exílio,
E na esquina da Gonçalves Dias realizamos nosso concílio,
Crânios dos cachorros, troncos calcinados e esculturas finas,
No lombo trazemos a verdade e nas mãos carregamos sinas.

Percorrem as pernas cansadas os trilhos de aço da ferrovia,
Sobre dormentes de madeira o som que há muito não ouvia.
Há velhas máquinas que gritam na madrugada rumo à morte,
E um velho guardião dos rios, segue traçando a própria sorte.

Não há ordem no caos, nem justiça na terra da barbárie,
E o dente social, na boca do mal é o que sofre com cárie.
Bodes usam coturnos, e porcos fumam charutos cubanos,
O que nos resta é a solidão dos últimos redutos humanos.

Entre as linhas da pele nossa própria história escrevemos,
Falamos o que ouvimos e enxergamos além do que vemos.
Dois séculos e tanto mais somam todas as nossas idades,
Então fazemos do tempo um cavalo alado de realidades.

O que importa é o caminho, e não aonde queremos chegar,
Importante são os pés, e não a estrada, o terreno e o lugar.
De aço é o trem e os trilhos, e de madeira são os dormentes,
E a terra fria do cemitério único remanso de nossas mentes.

Somos em três: um é profeta, o outro poeta, e um é pedreiro,
E nunca sabemos quem é um, o outro ou quem é o primeiro.
Falamos em círculos, por mesóclises ou por colorida elipse,
Um triângulo escaleno, ênclises, e cavaleiros do apocalipse.

Barra, Barata, Barcelos, ou em qualquer ordem três profetas,
Que o mundo insano insulta como se fôssemos meros poetas.
Trajamos armaduras dos guerreiros, ultrajamos o estandarte,
E fazemos do que somos, muito além da existência, pura arte.

27/10/2019
©Luiz Carlos Cichetto - Direitos Autorais Reservados