A República dos Idiotas
Luiz Carlos Barata Cichetto
O presente texto era para ser uma resenha sobre o filme "Idiocracy", em português "Idiocracia". Mas em determinado momento, percebi claramente que não poderia ser apenas uma análise sob o ponto de vista de cinematografia, mesmo eu não sendo um cinéfilo, um especialista e tentasse analisar apenas sob a ótica de espectador.
O filme, de Mike Judge, um dos criadores de Beavis e Butt-Head, lançado em 2006 é definido como sendo uma comédia, onde Joe Bowers (Luke Wilson), um acomodado burocrata do Exército que passa os dias assistindo TV é considerado como o QI "mais na média das médias" e por isso escolhido para uma experiência secreta onde, juntamente com uma prostituta, será congelado por um ano. O projeto é desativado e Bowers e a mulher acordam não um, mas quinhentos anos no futuro, quando os EUA tem como presidente um ex campeão de lutas e ex ator pornô, um negro de cabelos tingidos esticados com sobrenome latino e tem como ministros loiras peitudas, moleques alcoólatras e toda sorte de gente totalmente idiota. Taxado de criminoso e de "gay" por falar correto, primeiramente é condenado à prisão, onde para implantação de um CHIP de identificação é "batizado" com o nome de "Não Sei" e seu QI dado como muito acima da média. Ele foge da prisão e depois se torna Secretário do Presidente que o incumbe de resolver os problemas da nação, entre eles o de todas as plantas não mais nascerem, pois estão sendo irrigadas por um energético verde que também é usado em substituição à água em tudo, menos na privada. A população, convencida por uma corporação de que água é apenas para ser usada no vaso sanitário trabalha predominantemente na tal corporação e pede a cabeça do articulador da "absurda" idéia de irrigar plantas com água. Tudo ali é manipulado pelas corporações, mas ele consegue provar sua tese quando as plantas começam a brotar. Pouco tempo depois, ele se torna o Presidente e se casa com a sua companheira de jornada, a prostituta.
O filme é tratado em tom humorístico, com cenas que pretendem fazer rir. A presença de um narrador, tentando conduzir ao nível comédia completa a farsa. Sim, a farsa, pois "Idiocracy" não é, nem de longe uma comédia. Rir daquilo que mostra o filme, uma sociedade completamente dominada por pessoas completamente idiotas, sem o menor traço de cultura, sem sequer conseguir formular frase simples, só pode ser mesmo ser coisa de idiota. E talvez seja mesmo esta a intenção do diretor: "Se você achar graça disso, então você é mesmo um idiota!" ou "Faça cara de inteligente e assista este filme calado!" Ou ainda algo até mais contundente, mostrando que apenas idiotas riem de idiotas... "Idiocracy", em termos de cinema não é um grande filme, chega até mesmo a ser um tanto idiota - desculpem, mas o trocadilho foi inevitável. E talvez também tenha sido esta a idéia do diretor: fazer um filme idiota sobre uma sociedade de idiotas. Fazer um filme inteligente, intelectual, tecnicamente bem feito, talvez não surtisse o mesmo efeito. E aí o diretor seria outro: Woody Allen. Confesso que o tal Mike Judge me deixou confuso, até mesmo me fazendo sentir... Um idiota.
Mas, de fato é um filme que não será muito engraçado para aqueles que têm um senso critico apurado da atual realidade, do atual momento pelo qual a humanidade passa, pois ao olharmos ao nosso redor, percebemos que podemos trazer o filme uns quatrocentos e noventa anos para trás, mudar os EUA por um certo território na América do Sul e ele deixaria de ser enquadro no gênero "comédia", para se encaixar no de "documentário". Claro que não é privilégio, mas é de onde e para onde eu consigo dirigir meus olhos e ouvidos. Aliás, acredito que até na tradução do titulo para o português tenham tido o cuidado em não criar nenhuma identificação com a terra de Cabral, pois a palavra "Idiocracia" não existe nos dicionários da língua portuguesa, então, a distribuidora, inteligentemente (ou idiotamente) traduziu literalmente, talvez até desconhecendo o fato da palavra não existir em português. Se traduzissem como "A Republica dos Idiotas", fatalmente as pessoas iriam assistir pensando se tratar claramente de um filme sobre a História do Brasil, ou ainda algum filme "político" sobre o país nos últimos dez anos, transformado numa Idiocracia comandada por uma corja de idiotas sem caráter. Uma real e muito menos engraçada, mas nem por isso perigosa, Idiocracia.
Depois de massacrado por quase cem anos por golpes militares e ter passado por primeira experiência de "democracia" com um presidente enfiado goela abaixo, e depois retirado dela, pela grande mídia, a nossa Idiocracia Tropical adotou um sistema que elege "democraticamente" sucessivos idiotas, que vêm transformando a terra numa enorme e gigantesca favela. Não uma favela no conceito de exceção, do lugar em si, onde pobres se acumulam por falta de opção, mas no sentido de transformar a todos em mendigos, em pedintes, em esmoleiros, através de programas sociais burros e mal intencionados, que incentivam o crescimento da população de idiotas e maus-carateres. E ai, o cínico aproveitador se confunde com o idiota e, como no final de “Revolução dos Bichos”, ninguém mais sabe quem é um e quem é outro.
No início do filme que deu o tom deste artigo, o autor começa mostrando como teriam chegado aquele estado de coisas, ao mostrar as árvores genealógicas de dois casais. Um inteligente e com bom nível de informação e cultura. O outro, um casal de autênticos idiotas. A conclusão é simples: o primeiro casal pensa sobre todos os problemas que advem do nascimento de uma criança e assim acabam não tendo filhos, até que o marido morre. Enquanto o outro, o casal de idiotas enche o mundo de filhos. Dúzias de descendentes, dúzias de idiotas que se proliferaram, demonstrando assim como se chegou a uma população totalmente dominada por idiotas, que falam apenas por girias, consideram afeminado um sujeito que fala correto e premia um filme que mostra uma bunda o tempo inteiro com o Oscar.
E retornando às nossas terras no hemisfério sul, é muito mais vantajoso, deixar que os idiotas se proliferem, dar-lhes toda sorte de assistência social equivocada e mal intencionada, para que eles aumentem, proliferem e mantenham eternamente esse estado de coisas. Uma educação fraca e fraudulenta completa o quadro, mantendo essa situação eternamente, num circulo vicioso. Além disso, uma outra facção desse sistema torpe trata de disseminar a promiscuidade sexual, induzida pelo egoísmo e colocando nisso uma falsa idéia de liberdade sexual. Fora dos livros de poesia, a liberdade precisa ser sempre acompanhada da responsabilidade, e nesse caso representa: mais um monte de filhos não pensados, não planejados, que muitas vezes não terão o menor respaldo paterno e psicológico. Geralmente idiotas são contra qualquer tipo de prevenção, execram coisas como vasectomia e ligadura de trompas e, principalmente, idiotas não usam preservativos.
Mas o Estado incentiva tal coisa, dando a essas crianças uma assistência social fajuta, sob a forma de leite e remédios para que sobrevivam e cresçam, engrossando as fileiras do Exército dos Idiotas. E, através de um sistema de educação propositalmente incompetente, deixa que apenas um o outro se sobressaia, para assim manter viva a ilusão de que idiotas podem deixar de ser idiotas se estudarem. Mas, idiotas são deixam de ser idiotas porque estudaram, serão apenas idiotas estudados. E idiotas formados são piores que idiotas analfabetos. São muito mais perigosos.
Então, no que se tornará a maior parte dessas crianças quando crescerem? Estejam certos que elas se tornarão perfeitos idiotas. E se reproduzirão com a mesma facilidade, aumentando e aumentando em numero e espécie. E fatalmente serão sempre gratos aos que propiciaram essa situação, perpetuando o sistema. Salsichas insossas espremidas num enorme moedor de carne alimentando aos porcos. Simplesmente isso!
E antes que pedras cheguem à minha cabeça, me acusando de fascista, dizendo que estou discriminando aos pobres com essa colocação, devo dizer o seguinte: claro que os pobres, até porque são a maioria no mundo e os que mais se proliferam são os maiores responsáveis pelo crescimento da idiotização da espécie humana. E são idiotas não porque são pobres, mas porque vêm por gerações sendo idiotizados. Claro que nem todos os pobres são idiotas e contribuem para a Idiocracia... Apenas a maioria... Mas por outro lado, ser rico também não é sinônimo de inteligência. Aliás, muito pelo contrário. Ricos podem ser espertos, esse lixo que domina a cultura mundial e particularmente a brasileira, mas não necessariamente menos idiotas, até porque boa parte da idiotia básica e perene é praticada por eles. Em resumo, não é a classe social ou a cor da pele que fazem com que idiotas sejam idiotas. Os idiotas são de todas as cores e raças e classes sociais. Aliás, pertencem apenas a única classe predominante: a dos idiotas.
E os mentores da Idiocracia também tem outros métodos, como as religiões, que são a forma mais simples e eficiente de se promover a idiotização das pessoas. Usando de artimanhas sórdidas, esse braço potente completa aquilo que o Estado deixa de lado. É simples também o resumo do papel das igrejas: seja um idiota e o reino dos céus lhe pertencerá. E sob qualquer dogma, qualquer dominação, a conclusão será apenas esta. E é claro que também a elas, as religiões, interessam grandemente a proliferação de idiotas sobre a face da Terra, pois ao contrário do que pregam os escritos religiosos, não serão os justos que herdarão a Terra, mas os idiotas.
Mas, nem apenas de religião e igrejas se alimenta a Idiocracia. Dos esportes e das artes também. Não delas propriamente ditas, mas do mesmo fator covarde usado pela religião: o fanatismo. Esporte em si seria uma coisa saudável, claro. Mas quando se transforma esportes em competições acirradas que terão como premio o dinheiro e a fama, dando assim à vaidade o lugar de destaque ao transformarem esportistas como símbolos míticos, acabam com o que existe de bom neles. As fanáticas torcidas de futebol são o melhor exemplo disso. E o mesmo vale para as artes, quando criam a competição, os mitos, os ídolos. Enfim, quando os esportes e as artes são tratados como fenômenos de mídia, perdem suas essências e se transformam em apenas mais um item de manipulação, não os diferenciamos mais das religiões. Experimente falar mal de um clube de futebol que não é o mesmo do seu interlocutor, ou falar que um determinado astro da musica não é o gênio absoluto que a maioria acredita. O fanatismo cega, obstrui, embota o cérebro e, enfim, o fanatismo, seja ele de cunho religioso ou até artístico é segregador, e, portanto burro. E não existe nada mais idiota do que o fanatismo. Fanáticos em sua essência são idiotas! O pior e mais perigoso tipo de idiotas, porque além de outras coisas, fanáticos sempre andam em bandos, pois apenas assim se sentem fortes. E isso os que os torna muito mais temíveis.
Ademais, os teóricos e construtores da Idiocracia, conhecem armas muito poderosas de controle e principalmente de disseminação de suas idéias. Atualmente, disseminada mundo afora rapidamente por intermédio das chamadas redes sociais, o Marketing Social, filho do Politicamente Correto e neto do Patrulhamento Ideológico, tomou de assalto as mentes das pessoas, implantando códigos secretos de conduta que embotam e degeneram qualquer capacidade de raciocínio, qualquer resquício de inteligência. Ao pregar uma igualdade que não existe e nunca existirá; ao transformar a aberração, a promiscuidade e o desvio sexual em modalidade e normalidade, enfim, ao despertar e estabelecer conceitos éticos e morais com base apenas na vaidade e no consumo fácil, geram o que é preciso para criar uma classe de pessoas que no futuro bem próximo, comporá uma sociedade dominada por egoístas, narcisistas e hipócritas. Uma sociedade altamente doente formada por idiotas e controlada por idiotas.
Com o passar do tempo, as pessoas necessitarão mais e mais de ídolos, de mitos, de tutores, pois quanto menor é nosso grau de raciocínio, maior é a nossa dependência. E quanto menos palavras conhecemos, menor é nossa capacidade de raciocinar, como bem colocou Orwell quando falou da Novilingua. Estão simplificando as línguas, reduzindo palavras, criando vocábulos e simplificações absurdas nas formas de falar e principalmente de escrever. E o cérebro acompanha isso, atrofia, empedra e passa apenas a responder por funções vitais como comer, beber e dormir. E esse atrofiamento do cérebro decerto se tornará um fator genético, transmitido através dos cromossomos às gerações futuras, causando assim a involução da espécie. Será este o apregoado fim da espécie humana? Não por catástrofes naturais, doenças, fenômenos estelares e outros, mas simplesmente por uma atrofia no cérebro que transformará o ser humano em uma ameba gigantesca?
Mas, retornando ao inicio, quando falei sobre o filme "Idiocracia", não concordo apenas com uma coisa que o criador do filme coloca: a idiotização geral. Aliás, uma coisa passa despercebida num primeiro momento: todos ali, das pessoas mais simples ao Presidente da República são perfeitos idiotas. Todos? Nem todos, pois na história existe a corporação que domina a quase tudo e todos através de produtos que são colocados como absolutamente essenciais, como por exemplo, o tal energético. As corporações dominam tudo. E são eles também idiotas? Mike Judge não toca nesse ponto propositalmente? Quer deixar isso nas entrelinhas, para que apenas espectadores não idiotas percebam? Ou isso é algo nem ele mesmo pensou? E então faço a mim mesmo a pergunta: Mike Judge é um idiota ou um gênio? "Idiocracia" é um dos filmes mais inteligentes do mundo, ou apenas o mais idiota deles, feito apenas para que idiotas assistam? E para que outros idiotas feito eu tentem entende-lo e mostrar a outros idiotas que não se acham idiotas...
Mas, por fim, estamos chegando a uma linha de limite da sobrevivência da espécie humana, como ser pensante e dominante do planeta. Ou acordamos agora e passamos a aceitar menos as imposições dos dominantes, e começamos a pensar com nossas próprias cabeças, agindo de acordo e com base no pensamento critico, ou estaremos todos assistindo o fim de nossa própria espécie. A consciência critica, baseada na informação e na cultura livres, é a única coisa que poderá nos salvar da extinção.
Deixo a seguir, uma adaptação minha do texto do discurso de posse do Presidente "Não Sei" dos EUA, 2.505 DC, no final do filme.
"Houve uma época neste planeta, em que pessoas inteligentes eram consideradas legais. Nem todas as pessoas inteligentes eram legais, mas pessoas inteligentes fizeram coisas como navios, pirâmides e até foram ao espaço. E houve uma época nesse planeta em que ler não era coisa de gente esquisita. E muito menos escrever. E que pessoas escreviam livros e filmes e tinham histórias. E não importava de quem era a bunda e porque estava peidando. E acredito que essa época vai voltar.”
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