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20/11/2012

A Contramão da Contramão

A Contramão da Contramão
Luiz Carlos Barata Cichetto



O escritor Anthony Burgess, autor entre outras coisas do livro no qual foi baseado o filme "Laranja Mecânica", escreveu certa ocasião, a respeito do que seria o leitor seu ideal: "um músico católico não praticante e fracassada, míope, daltônico, auditivamente tendencioso, que tenha lido os livros que eu li. Ele também deve ser sobre a minha idade." Dono de um pensamento impar com relação à sociedade humana, Burgess tenta a meu ver entender, não definir, o perfil de seu leitor.

"No fundo estamos condenados ao mistério. As pessoas dizem, eu gostaria de sobreviver além da minha materialidade... Eu não acredito que vá sobreviver, mas, pelo menos na memória dos outros, você sobrevive..." Fernando Henrique Cardoso 

Claro que um paralelo entre um escritor com milhões leitores e exemplares de livros vendidos e lidos no mundo inteiro, por décadas e décadas e um escritor com uma quantidade de leitores que não encheria uma “Kombi” e que vendeu meia centena de exemplares de cada um de seus livros pode parecer presunção deste último. O primeiro é um sucesso literário, e o segundo? Também! E também, sim, pois ao realizar sua obra, publicando seus escritos não da forma tradicional e única nos anos em que o primeiro viveu, o segundo é autor de milhares de poemas, centenas de crônicas e uma produção constante durante 40 anos, embora em muitos momentos a tenha deixado em segundo plano, em detrimento de atos menos nobres mas mais humanos como criar filhos.

Sou daqueles que tem muito mais textos escritos que leitores. Afinal, nos dias correntes, existem mais escritores que leitores. Basta uma simples olhada no Google para se encontrar milhares e milhares de sites e blogs de pessoas que se consideram poetas e escritores. Editores de textos facilitam a tarefa. Nada daquela coisa chata de escrever um texto a mão, reescrever, datilografar, usar corretivo, re-datilografar, corrigir. Tudo agora é mais fácil, até mesmo o Corretor Ortográfico facilita o trabalho, impedindo erros absurdos. Escrevedores não escrevem errado, afinal, cometem "erros de digitação", e o mágico programinha corrige automaticamente. Particularmente ainda uso antigos métodos como desenhar o esqueleto de um texto no papel, anotar as idéias mentalmente e rascunhar ainda usando caneta vermelha (odeio a azul, me lembra os tempos de escola), depois digito tudo usando o Bloco de Notas, que por não ter nenhuma função adicional, nem botões para desviar a atenção, e é que mais me parece com a velha “Olivetti Valentine”, minha máquina de escrever.

E quanto ao restante, sim é possível viver, embora esse viver na contramão tenha um alto custo não apenas para quem o abraça, quanto para quem está do lado. É um fardo pesado, um preço alto. Em outras palavras, quando se tem um pensamento na contramão, mas é um FHC, por exemplo tudo se torna mais fácil, agora quando se pensa da mesma forma e se é simplesmente Luiz Carlos Barata Cichetto, a coisa muda. A gente acha, por outro lado, que o sistema se incomoda com a gente. Mas isso não é verdade. Eles estão pouco se fodendo pra gente. Incomodamos? Não... Ou apenas como uma mosca mesmo. Um tapa e fim. Mas de qualquer forma é importante sobreviver, acreditar que podemos. Enfim, viver por si e a partir de si. Se fizermos um coquetel dessa nossa postura underground com as idéias de Ayn Rand? O que teremos?

Mas retornando a questão do perfil de leitor, pode se imaginar que é mais fácil definir o perfil de seu leitor quando é pequeno esse numero. Mas, ledo engano, meu querido leitor (está vendo, eu tenho ao menos um leitor: você!) E então espero, não por imposição, mas por necessidade de uma troca, entender quem és. Afinal sabes um tanto sobre mim, como eu penso e muito do que sou através do que escrevo. Mas e quanto a você, eu não conheço absolutamente nada. E fico imaginando o que pensa e porque ama ou odeia o que escrevo. Quem é você, afinal, meu único leitor? Mas não seria outra a pergunta, tipo como eu gostaria que você fosse? Vou tentar responder as duas perguntas em apenas uma resposta.

Acredito que por simplificação, mais do que por desejo, o leitor de meus artigos são pessoas iguais a mim, então bastaria que eu traçasse nestas linhas meu próprio perfil e estariam respondidas as duas perguntas. "Ateu não por opção, mais de cinquenta anos, belo nível cultural, apreciador de Rock, depreciador de musica comercial; expansivo, corrosivo; fumante total, bêbado eventual..." Entretanto um perfil meu, servindo de perfil alheio seria simplista demais, vago demais e perigoso demais, pois limitaria o "padrão" do meu leitor a mim mesmo é mais uma meia dúzia de pessoas... Exatamente como realmente ocorre. Enfim, não tenho a resposta a respeito do perfil de quem me lê. E nem quero ou pretendo, pois o que espero é a pluralidade, a diversidade dos seres humanos à despeito das regras que empacotam serem humanos depois de homogeneizados e os despacham. E do mesmo jeito que não escrevo como produto, não escrevo para produtos. 

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