Barata Cichetto
Sou, desde que poeta e filósofo, igual a uma mãe pervertida, que gera filhos às pencas. Que transa com imundos na imundice das ruas, para depois parir em estrebarias e bares das periferias, a filhos prematuros, imaturos, inseguros, que alcançarão o mundo e sobre ele avançarão transformando-o numa pocilga nojenta. Como pai, filósofo e poeta, dou aos filhos a chave da desgraça, sabendo que tarde ou antes, a transformarão em maldição. Não contra mim, mas contra toda essa humanidade pervertida à beira de um abismo inevitável. Sem que percebam, farão o que quero de suas mentes, o que desejo de seus corpos. E na perversão do mundo, a ira os consumirá, o tempo os devorará. E a destruição será total. Sem retorno, sem trégua. Sou Chronos, Baco e Sade no mesmo corpo, na mesma mente. Blake em tarde de tempestade. Rimbaud, o mercenário não o poeta. E enquanto poeta e filósofo, criança amaldiçoada no ventre e quase morto berrando contra o tempo, quebrando a segurança, o protocolo e o paradigma. Não há mais retorno. Lancei os dados, joguei sua sorte. Agora fiquem com aquilo que plantaram em mim. Fiquem com minha vingança, minha revanche e meu asco. Dentro de algum tempo todos estarão mortos, de qualquer forma. Não tenho moral, mas também a imoralidade me enoja. Estou morto, mas sou imortal. Transpiro sangue, tenho dores de cabeça horrorosas. Odeio cheiro de rosas, deixem que apodreçam com sua beleza, em algum jardim bucólico do outro lado da rua. A mim interessam putas magrelas e fedidas que choram de saudades pela buceta em orgasmos secos e surdos. A mim interessam as adulteras que sangram em cada traição, que choram por contradição. A mim interessam livros, um naco de pão e um café quente. De fato, nada mais espero de mim, de si, de per si. Nada além da única moral que sobreviverá a mim: o fim. Ninguém conhece o sentido do fim. Nada existe no fim, portanto, nada é o fim. A mão que segura o pêndulo é a minha, que treme. Não há destino, não há remédio, apenas sofrimento. E tédio.
22/10/2015
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