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27/05/2018

Dia da Saudade

Dia da Saudade
Barata Cichetto

Acordei com saudades. Uma saudade sem lembrança. Todas as saudades são lembranças, mas não a minha. Não tinha rosto essa saudade, ao contrário de todas as saudades que se sente. A minha não era de ninguém, nem de mim mesmo. Era uma saudade surda, cega e muda. Uma saudade tão intensa e tão extensa que quase não pude perceber.  Mas sabia que ela estava ali. Quentinha feito uma buceta. Desleixada feito uma puta. Terna feito uma mãe. Eloquente feito um padre. E eu não sabia se eu a expulsava da minha cabeça com um tiro na fronte ou com uma gilete nos pulsos. Maldita saudades que eu não queria ter na minha cama. Que fosse até mesmo uma traveca de peitos de silicone, ainda vá lá, mas não essa saudade alienígena. Quem ela pensava ser para me abordar, me tirar da cama aos berros feito um policial à paisana? Hein? Quem era ela para me acordar desse jeito, feito uma telefonista de call center dizendo aguarde na linha, senhor, enquanto transferimos sua ligação? Que bosta era aquilo agora? Eu era apenas um pequeno escritor que nem sequer conseguira ter estatura para alcançar o espelho. E lá vinha aquela maldita saudade me atormentando feito uma empresa de cobrança que tentar negociar o boleto de uma calça que comprei tem cinco anos e ainda não paguei. Nem vou pagar. Foda-se essa saudade.
Fui à cozinha e preparei um café, depois sentei na mesa onde duas baratas batiam um papo sobre a ultima greve que a merda dos esquerdistas inventaram para foder com tudo. Elas fumavam uma bagana fedorenta e palitavam os dentes com ossos. E me olhavam de um jeito estranho que só baratas sabem olhar. Dei um tapa nas duas e as esmaguei contra o piso da cozinha. A saudade sentou na minha frente e ficou me olhando. Pensei em fazer com ela o que tinha feito com as baratas, mas ela me olhou bem fundo nos olhos e me deu um tapa no rosto que ardeu para caralho. Sua vadia, eu disse. E ela deu outro, do outro lado da cara. Sua puta. Tornei a gritar. E ela se levantou, abriu a porta e deixou duas cadelas enormes entrarem. Eram reluzentes e tinham duas bolas de gude cinzas no lugar dos olhos. E elas me devoraram com seus dentes afiados. Ainda vi minhas tripas sendo arrastadas pelo chão encerado da cozinha antes de fechar os olhos. As baratas se contorciam. E riam de mim, de um jeito que somente baratas sabem rir.
27/05/2018

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