1000 Caracteres
Barata Cichetto
Barata Cichetto
Recolho-me à insignificância das coisas; à significância das palavras, que ainda teimam em ter significado, mas que no fim sabem que nada mais significam: estão tão perdidas e são tão insignificantes quanto eu. Recolho-me à insignificância dos gestos perdidos, dos afetos escondidos e dos tetos destruídos. Não há mais palavras: estão mortas. Mas eu ainda as chamo, feito um ator no final de uma peça, chama pela musa morta em seus braços, enquanto a plateia aplaude, e depois vai para casa, sem nenhum remorso. Não há mais o que falar. Tudo já foi dito. E não resta nada a não ser me recolher à insignificância. Do não ser, do não estar. E não estou aqui, não sou daqui, não sou de lugar nenhum, e não estou em lugar algum. Não moro aqui, não moro em ninguém, não moro em mim. Encolho a cada dia, feito personagem de um filme antigo, em preto e branco: desbotado, apagado, rasgado. No escuro. Encolho até não restar. Sou menor que uma partícula de nada. Não há mais lugares aonde ir. Fui longe demais quando me afastei de mim. E o caminho não tem volta. Sem revolta e sem metáforas, sem poesia, sem palavras. Sem nenhum significado a mais. Ou a menos. Apenas minha própria insignificância. Recolhida em palavras.
04/02/2019
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