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10/07/2019

Que Venham as Putas!

Que Venham as Putas!
Luiz Carlos Cichetto

Quero acordar de manhã tossindo e peidando. Fumar quatro maços de cigarros por dia, beber todas as cervejas que existem e depois bater cabeça ao som do bom e velho (ou novo) Rock'n'Roll. A liberdade é minha e eu a conquistei. Sou Barata e não barata, sou anjo, rebelde e torto, solto principalmente. Minhas asas não carregam ao céu nem ao inferno, porque como disse, estou livre. Não prendam minhas asas, não amarrem meus pulsos. Deixem minhas pernas caminharem até onde eu quero. O destino é meu e de nenhuma bruxa. Não quero dizer eu amo, porque não retrata meu ser. Quero peidar sem censura e andar sem frescura. Acordar e tomar café na padaria, andar as cinco da manhã falando com os mendigos do centro da cidade. Quero beber até cair, cair até beber. Beber com as putas, beber, beber... E dai, que alguém tem com isso? Depois de cinquenta anos minha vida é minha e não quero mais tomar conta de ninguém. Cada um que tome conta da sua própria existência. Não sou professor nem padre. Deixem rolar as pedras, Keep The Rolling Stones, Meet The Beatles e Purple haze into my brain. Não caio em buracos porque aprendi a andar pelas calçadas, minhas pernas estão soltas e minhas botas gastaram os saltos de tanto eu pisar em pedras. Mas as putas ainda gozam e bebem comigo. Acreditam em putas que gozam? Eu também! Apenas não acredito é em anjos, porque anjos não gozam... Nem fingem. Quero putas e desejos alados, pés bonitos e olhares lânguidos. Cansei de olhares cansados e que imploram por dinheiro e misericórdia. Freiras e putas estão perdidas. E daí? Quero transar com todas! Ontem bebi até cair e quase não acho o caminho de volta... Mas nem sempre quero voltar. Voltar para onde, se eu nunca sai? Deixa de frescura, que eu não gosto de beijo na boca. Gosto mesmo é de chupar bucetas de putas. Eu não posso recolher seus cacos porque ainda nem acabei de recolher os meus. Não quero mais caminhar carregando pedras. Desliguei o telefone, aliás arranquei o fio. Rasga meu número, esquece o endereço. Eu não moro em lugar nenhum nem com ninguém. Não quero magoar ninguém então prefiro estar só. Moro dentro de mim e entro dentro de você apenas para ver seu coração e o sangue que corre em suas artérias. O mundo é uma buceta quente e melada e eu quero me enfiar nele. Até o pescoço, quero chupar feito manga até o caroço. Oh, minha querida, apaga as luzes que estou de ressaca e a lua incomoda. Desliga o botão e apaga o sol. Quero dormir até mais tarde hoje. À noite todos os gatos são pardos e todas as gatas estão no cio. As cadelas gemem de tesão e eu quero mesmo dançar Rock'n'Roll. Let it bleed. Eu não sangro mais porque não quero. Dor nem sei mais o que é, do mesmo jeito que saudade. Saudade, falam, existe apenas na língua portuguesa. Então inglesas não sentem saudade? Austríacas não sentem saudades? Que estranho! Nem eu, que sou o mundo sinto saudades. Saudades? Apenas do cigarro que acabei de apagar no cinzeiro. E da garrafa de Cynar que acabei de tomar. Daquela putinha que fodi ontem naquele puteiro cheirando a mijo e incenso barato também. Meus cabelos estão longos e minha paciência curta. Não tenho idade para ter paciência. Paciência é coisa de velhos, por mais paradoxal que isso possa parecer. Acorda, que eu tive um pesadelo anteontem, uma noite em que eu não consegui dormir, porque a lua não deixou. Abriram um buraco no meu peito por onde quiseram entrar, mas eu eu tapei rapidinho, com o asfalto que sobrou. Minha barriga ronca mas eu não quero comer agora. Não gosto de comer sozinho e então prefiro não comer. Tomo outro gole de café gelado porque estou com preguiça de esquentar. Porque chegastes chegando e ai foi falando em paixão? Eu não quero! Por um momento acreditei que poderia querer outra paixão, mas tenho que continuar afirmando: amor? Nem de mãe. Porque eu sei que apenas a dor carrega à sabedoria e quero apenas saber com quantos paus se faz uma canoa. Quero construir minha canoa e atravessar o rio até a outra margem, onde putinhas de dezoito anos esperam para chupar meu pau. E o rio é feito de Cynar. Até lá, quero estar em qualquer lugar e acordar onde quiser. Tem uma puta que gosta que eu a chupe, então... Um monte de livros ainda precisam ser lidos e eu nem sei por onde começar. Parece que foi ontem e a semana que vem ainda nem começou. Fui dormir cedo porque enchi a lata, até a tampa... Então não ligue que estou pelado e bêbado. Até qualquer hora onde a estrada poderá carregar. "Bêbados não marcham" e eu nem quero marchar. Soldados são tristes e as putas são alegres. Então que venham as putas!

11/5/2007

Coçar a Cicatriz, Xingar a Meretriz e Sonhar Com a Imperatriz

Coçar a Cicatriz, Xingar a Meretriz e Sonhar Com a Imperatriz
Luiz Carlos Cichetto

Au Salon de la rue des Moulins - Henri de Toulouse-Lautrec

Queria mesmo deixar de falar sobre a ferida que teima em doer, da falta do remédio e da falta de destino, mas o que consigo apenas coçar a cicatriz, xingar a meretriz e sonhar com a imperatriz. É difícil pensar sem sentir dor, difícil chorar sem lágrimas, difícil é perceber que não existe um caminho. Quebrei meus óculos e agora não consigo enxergar um palmo adiante de meu nariz. Que importância tem isso pra quem da vida ainda é aprendiz? Onde minha verdade me levará? Bem mais longe que suas mentiras! Deixei uma porção de sonhos enrolados em papel de seda, dentro de uma caixa de madeira que eu mesmo construí, além de um colchão e de um fogão. Pouco importa onde deitar e que camas que esquentar, porque estou congelando no Inferno. Mas porque então tenho uma tristeza infinita, o coração apertado que não sei quando é saudade e quando é ódio? O ócio causa o ódio e eu nem sei até que esquina eu chego sem tropeçar. Há bêbados e putas demais nas ruas e as estrelas não tem graça nenhuma. Preciso de uma eternidade, quero a humanidade, sei que estou perdido e o caminho é comprido até o fim. Pedras esparramadas, hematitas, navalhas e relógios. Então, conto um conto e não aumento um ponto. A que ponto chegamos? A que ponto chegamos! Ao ponto final, de exclamação, de interrogação eterna. Pontos, reticências, acentos. Sem aspas nem caspas, apenas cabelos pintados da cor do Inferno. Andar é caminhar e não sei ficar parado. E eu, que  nunca entrei num motel. Foder é bom, transar melhor, mas o ideal é fazer amor. Tem mulheres que gostam de dar e se acham liberadas, mas elas gostam apenas de dar então são apenas putas. Não gostam mesmo de sexo, nem de homem, gostam de dar. Mulheres de verdade gostam de dar... E de receber... De doar, não apenas dar. Boca suja, cala a boca e abre as pernas, sua piranha! Putas não gostam de sexo, gostam de dinheiro. Então onde estão as mulheres de verdade? Trepar, transar, meter, foder... Tudo isso tem que ser uma troca de desejos, de líquidos, sólidos e gasosos. Não apenas de dar... E receber... Dinheiro ou coisas de volta. Onde é que está meu Rock'n'Roll??? Existem as putas, as fêmeas e as mulheres. As putas gostam de dar e tem orgulho disso, apenas dar a buceta e receber sempre algo em troca, de favores a dinheiro, de suporte de carência a remédios; de documentos de posse a posses de documentos, incluindo ai certidão de casamento. As fêmeas também gostam de dar não apenas dar a buceta, mas dar carinho, paixão; mas termina no sexo a relação; apenas satisfazem uma necessidade fisiológica. E sabem suportar melhor a dor... Dos outros... Mas existem por fim as mulheres... Uma espécie animal em extinção, pois gosta de dar a buceta, mas também de chupar, de ser chupada, de gozar e fazer gozar, mas também está pronta para a dor em comum e que consegue gritar tanto de prazer quando de espanto, que segura tão bem uma espada quanto segura um pinto; que segura tão bem a barra de ser companheira e guerreira. Onde andam as mulheres? Não sei! As putas e as fêmeas eu conheço bem. Onde andam as mulheres? As mulheres podem ou não ter tatuagem, possa ou não usar piercings, saias curtas, botas e estereótipos de putas e fêmeas, mas precisam ser mulheres, não apenas putas ou fêmeas. Precisam sim gostar de sexo e de dinheiro, mas não podem ser escravas do desejo e da cobiça. Rainhas não existem ou são caras, putas são caras, fêmeas são caras, mas mulheres de verdade são baratas. Peco por falar, pecados do calar, emudeço quando tenho sede, morri na beira de um poço, mas ah, seu moço, deixa eu morrer em paz que ainda tenho um caminho comprido a percorrer. Tenho dois livros a ler e outros tantos que não consigo entender. Nunca entendi os poetas nem as mulheres, são todos fingidos e mentirosos. Quando eu acordei ontem tinha uma dor nas pernas e nem conseguia andar. Não existe remédio que faça um morto caminhar. Acordo? Nem quero, é melhor dormir e ter pesadelos. Quero uma navalha, cortar minha jugular, deixar meu sangue escorrer, porque sem sangue não sinto dor, não sinto nada, não sinto saudades daquilo que não posso sentir. Saudades da dor, pobre poeta idiota! Acreditastes que ao falar era com sua alma, não com sua buceta! Acreditastes nas outras vidas quando é nesta que tens que acreditar, seu inútil! Papagaios e cadeiras de balanço... Bobagem! Abandonastes sua arte em troco de uma buceta??? Burro! A arte lhe dará tantas bucetas quantas puderes foder! Ou não! Mas de qualquer forma sua arte é uma grande buceta cabeluda, gostosa e cheirosa... Buceta de puta... Gratuita que não lhe faz pagar por um prazer que é só dela. Acorda, portanto e segure seu pinto, bem duro e bem tesudo. Anjos tem asas, mas galinhas também tem! Nunca confire em paixão de putas, putas mentem, e quem mente também rouba, esta era a filosofia da mãe de Ray, Charles. Real filosofia. Deixa eu escutar Miles Davis, chorar até secar e depois espetar um palito de churrasco na jugular. Segunda-feira é dia de trabalho, seu imbecil, deixa de lamento e pega uma picareta. Arte não é trabalho, arte é vagabundagem, lembra o que a professora lhe falou. Chutaram seu rabo, não é, Poeta Idiota! Então deixe de ser idiota, ou deixe de ser poeta, o que é a mesma coisa. Putas são frias, geladas e usurárias, não acredite em seus gritos de paixão. Ninguém reconhece um artista, nem um pedreiro, mas pedreiros constroem casas e casas dão prazer. Então um pedreiro constrói o prazer? A luta é dura e meu pau agora amoleceu. Não como mais nenhuma puta sem dinheiro. O preço das honestas é muito maior. Caras putas, caríssimas honestas. Deixa estar que um dia eu lhe compro um par de brincos de ouro, um anel solitário e outra navalha. Atende o telefone, que é seu cafetão. Atende o celular que é alguém querendo lhe alugar. Desabafa então comigo sobre o que é ser puta e eu lhe desabafo sobre o que é morrer. Ambos estamos mortos, a diferença é que sei do que se trata morrer. Sei o preço das coisas. Deixe então de ficar procurando o gozo das putas e encontre o seu, Poeta dos Infernos! As putas te seguirão, Poeta das Perdidas! Encontre seu caminho, e faça com que ele seja apenas seu! O que é seu lhe pertence, por direito e de fato. Crie seus próprios vaticínios, crie seu próprio destino. É seu e de ninguém mais. Para ser forte não é preciso carregar ninguém nas costas. Fui!!!

10/5/2009

09/07/2019

Carta de Um Velho Safado a Uma Barata de Bar

Carta de Um Velho Safado a Uma Barata de Bar
(Um Tributo a Charles Bukowski)
Luiz Carlos Cichetto


Olá, querida barata:

Estou lhe mandando a presente afim de lhe contar o quanto foi importante o nosso encontro de ontem á noite, quando eu tinha bebido demais, fumado de mais e amado de menos.
Sabes, querida barata, que aquele bar onde nos encontramos carrega por aquelas imundas e gordurentas mesas e balcão, histórias que apenas as baratas e a sarjeta da rua em frente conhecem.
Minha cabeça dói, amiga barata e acaso a sua também doa ao mexer suas antenas, não ligue, em poucas horas ou depois de outro porre, passa.
Hoje, escondida pelas frestas ao lado da pia imunda da cozinha do bar, certamente não lembrarás mais de mim e sei que outros bêbados solitários encontrarão em suas antenas, os ombros que precisam.
Têm horas que penso que sou igual a uma barata, mais porque nós humanos lhes achamos imundas e doentias, menos porque respeitamos sua capacidade de sobrevivência; mais porque as tememos, menos porque as respeitamos por sua capacidade de alimentar de absolutamente qualquer coisa, enquanto precisamos comer em bares e plantar e esperar.
Querida amiga, a solidão humana é coisa que apenas as baratas compreendem e sei que quando escutastes sobre minha solidão gargalhaste de um jeito a querer dizer "Estou certa disto!".
Sabes, amiga barata de balcão de bar, sou apenas um velho safado, nem carteiro nem poeta, apenas arremedo de escritor. Mas como escritor escrevo e como o carteiro entregava cartas ao poeta, lhe entrego esta, certo de que com o mesmo respeito que o poeta tratava o carteiro e suas cartas, tratarás a mim e minha carta.
E, amiga barata, sou apenas um velho safado, carteiro da ilusão, da angústia e da solidão. Sabes, querida amiga que encontrei naquele balcão fedorento e gordurento, queria lhe agradecer por escutar minhas queixas e minhas mágoas, por ficares ali, parada, quieta, escutando cada palavra que a embriagues me impunha, me trazia á boca e eram pronunciadas com dificuldade.
Obrigado por ficar ali, apenas mexendo suas antenas, sem censura nem pudor. Queria lhe agradecer por bebericar minha bebida em goles tão pequenos, por andar de um lado ao outro do balcão tomando conta de mim, quanto a bebida me fazia dormir; por andar nas bordas do meu copo tomando conta dele, porque afinal quem beberia num copo em que uma barata andara?
Queria lhe agradecer porque quando finalmente minhas pernas responderam aos impulsos do cérebro embriagado e responderam mesmo que trôpegas aos passos, também correstes de volta a sua fresta junto a pia da cozinha do bar, de um jeito a me dizer "Bom dia!".
Queria saber, querida barata de bar cujo nome - igual a de tantas putas com as quais dormi - desconheço, sobre o que achastes daquele livro que eu portava e que passeastes pelas páginas abertas, um pouco invejosa porque não falava de ti, mas de moscas de bar. Grande injustiça aquela, realmente! É é por isso que decidi lhe mandar esta carta e espero que a leia antes que o dono do bar descubra teu esconderijo, logo ao lado da pia da cozinha, onde ontem á noite não me deste um beijo de bom dia!
Sei que por sua coloração - e eu andei estudando sua espécie do mesmo que jeito que estudas a minha - também és uma veja velha barata safada. Aliás, porque me refiro a você no feminino, se nem sei seu sexo? Mas realmente não importa que sexo um amigo tenha ou se é uma barata ou outro ser, mesmo que humano. O que sei é que pensas, porque mexes as antenas o mesmo jeito que eu quando penso, balanço os braços. E sei mais ainda, que fantástica amiga serias por ter três pares de braços (ou seriam três pares de pernas?).
Não ligues, não, ás queixas deste que lhe manda esta carta, sou apenas um bêbado, um velho safado em busca de uma paixão perdida. E uma paixão eterna e etérea, a paixão pela vida, perdida - a paixão ou a vida - em um tempo em que eu não era nem velho nem safado, nem bêbado sequer era. Aliás o que eu era era um não ser, mesmo que um ser humano, enquanto sempre fostes e serás uma barata de bar.
Não mostres, minha cara, esta carta a outras baratas e principalmente a outros seres humanos porque, principalmente estes, hão de dizer que além de um velho safado, sou um velho louco, conversando com baratas. Certamente irão dizer que a bebida e a solidão embotaram minha mente a ponto de ter delírios e, embora digam que não, irão incluir minha carta em um fabulário geral do delírio cotidiano. Guardes segredo, amiga. Mas não o segredo dos padres, mas o segredo das adúlteras.
Quando quiseres, abandonas a fresta próxima a pia nojenta e gordurenta do bar onde a conheci e chegues a minha morada. Ali terás o abrigo em uma fresta próxima de minha cama, onde meus pesadelos acompanham as noites em que não durmo embriagado. Terás ali papel e bebida, que é tudo o que precisam um escritor e uma barata. Serás então minha confidente de todas as noites, sem que eu precise beber debruçado num imundo balcão de bar afim de poder me escutar.

5/11/2001

Matemática

Matemática
Barata Cichetto

Um poeta não é um ser, é apenas um estar,
E poesia um zero menos um do que restar.

Não é um poeta um que possa ser posto,
Junto a um escritor, em seu lado oposto.

Um poeta é indivisível por dois, só por si, não a esmo,
Mas dois poetas são divisíveis por dois e por si mesmo.

Um poeta nunca é igual a outro poeta na adição,
Mas ao retirar um de dois a sobra é a contradição.

Multiplicar um poeta por outro é igual um problema,
Sendo o resultado da conta apenas um falso teorema.

Divida um poeta por dois e não lhe sobrará resto algum,
Um meio é igual a um nada, que é igual a um nenhum.

Subtraia a poesia de um, e a sobra é a matemática pura,
A sobra é um zero e nada é diferente na gramática dura.

Um poeta não é um um, nem um zero, nem um dois,
Nenhum poeta é um número, nem antes, nem depois.

08/07/2019

Tudo Certo. Tudo Politicamente Correto

Tudo Certo. Tudo Politicamente Correto

Um homem idoso dá uma cantada sexual numa garota de vinte e poucos. Ele diz que ela é gostosa, que quer transar com ela e um monte de coisas. Ela responde que não vai transar com um velho babão e xinga o velhote de machista, diz que ele não se enxerga e um monte de coisas. Ela o processa por assédio. Ele a processa por preconceito contra idoso. Estão presos. Ninguém trepou com ninguém. Nenhum dos dois gozou. Ela virou lésbica na cadeia, afinal homens são todos uns porcos. O velho morreu na cadeia, afinal lá se dá ou se morre protegendo o cu. Os advogados processaram os dois por falta de pagamento. A União recolheu as custas do processo. Os políticos fizeram as leis para proteger a sociedade. O presidente foi pego roubando. Ninguém sabe. Ninguém viu. A garota foi pra Marcha para Jesus. O velho para o cemitério.

A vida segue. Está tudo certo. Está tudo politicamente correto.

21/10/2017

05/07/2019

Like The Hurricane

Like The Hurricane
Barata Cichetto
Antagônico, busco uma dor que enfraquece meu corpo, mas fortalece a minha alma; irônico, dou tiros no escuro tentando abrir buracos na escuridão; crônico, sonho com minhas doces amantes e tenho pesadelos amargos comigo mesmo.
Sou feito o furacão, like the hurricane, forte, inquieto e destruidor, mas apenas uma força natural; consumo a mim mesmo, depois parto deixando uma lembrança de mim que nenhuma outra tormenta apaga; lembro de mim mesmo com ódio e com ternura daquilo que destruí; tenho saudades do parto e saudades antes do partir, mas depois parto ao meio meus sentimentos e dou a metade que sobrou à mendiga que, enlouquecida e entorpecida pela fome, brada que a insanidade é inerente á humanidade. 
Poeta profundo, do tipo perdido, que apenas encontra salvação na arte, num tipo de arte dolorida e inglória; mas não tentem salvar minha alma, que ela foi perdida quando eu nasci; não tentem salvar a mim de mim mesmo; ninguém é perfeito, mas eu não sou um mal sujeito, nem bom bem mal, apenas Poeta.
Estou à solta, sem crime nem castigo, sem perdão nem oração; categórico, instalo bandeiras no alto do meu precipício, depois salto de cabeça do alto do edifício; mas não busquem meus pedaços na calçada, peguem as folhas soltas das poesias que lancei ao ar no momento da minha queda.
Eu morro, mas não solto, padeço, mas não largo mão, apodreço, mas não... Não, não morro enquanto viver em mim a dor. Pobres amantes, não entendem de dor, nem da dor causada por elas mesmas! Não sou rocha, sou tocha humana queimando de minha própria combustão; não sou cristalino em minha dor, guardo as maiores a mim mesmo; e não acredito em anjos nem em deusas, sou um demônio que foi jogado á Terra em busca de pedras perdidas, asas partidas e putas arrependidas.
Reflito agora sobre a liberdade e as guerras santas, internas, contra mim e contra o que eu achara ser amor. Não posso amar, não sei mesmo o que é o amor que proclamam nas histórias, nos poemas e nos filmes. Porque meu amor é mais intenso e quente que qualquer história. Nem àquelas por quem abandonei minha alma, também conhecida por "Poesia", souberam compreender.
A arte, apenas ela, compreende e procura aqueles que a alimentam e suprem. Arte é autofágica, vampira e santa ao mesmo tempo. Arte é feito cachorro: é ele quem escolhe seu dono e não adianta outro alimentar que ela irá lhe morder a mão.
Agora, preciso sair e fumar, cigarro pode matar. Pode! Mas a vida mata ao certo, viver é fatal; é proibido pensar em áreas públicas, de uso comum; é proibido ser poeta, que arte é cancerígena; ambientes enfumaçados deixam o cabelo das belas fedido. Então, amadas, lavem o cabelo e deixem eu morrer tossindo.
Sonhei com minha própria morte - “Era um sujeito de sorte aquele homem!”, declarou sobre meu caixão uma puta, trajada de preto e com um cigarro na mão; amadas riam bebendo refrigerantes baratos, padres gargalhavam e o único choro que podia ser escutado era da Poesia, prostrada e um canto, desenhada em uma folha de papel.

09/12/2009

04/07/2019

O Dia Em Que Eu Morri

O Dia Em Que Eu Morri
Luiz Carlos Cichetto
Imagem: Jonny Lindner por Pixabay

O dia em que eu morri foi igual ao dia antes e ao dia depois de eu morrer. Para muita gente foi diferente, mas não para mim. Naquele dia, assim como nos anteriores e nos posteriores, eu não sabia que tinha morrido. Todos são dias de morto para mim.
No dia em que eu morri, como em todos os outros dias, eu não fui lembrado, a não ser por três ou quatro amigos. Alguns até lembraram mandaram uma mensagem à viúva afirmando minha bondade e outras inverdades que se falam quando alguém morre, ou quando se deseja bajular. Estranha essa mania de as pessoas bajularem os mortos, como se eles tivessem ouvidos, como que se pudessem ser ouvidos. Ou como se quisessem.
Aquele dia eu não acordei, como não acordo nenhum outro dia. Não inspirei em aspirei o ar como nunca faço. A diferença foi que não acendi um cigarro, nem preparei café. Apenas fiquei deitado, morto, como faço todos os dias antes de morrer.
No dia em que morri, como em todos os outros em que estive morto, meus filhos não falaram comigo, ocupados com suas lutas, meus pais continuavam preocupados, como em todos os outros dias em que me abortaram, em guardar dinheiro para quando morrerem; e todos eles tiveram desculpas para não me verem morrer: as mesmas desculpas que usaram para não me verem viver.
O dia em que morri não aconteceu nada além da mesmice de todos os outros dias: políticos continuaram roubando e as pessoas brigando por eles; os donos do mundo continuaram a mandar, e os mandados continuaram a andar pelo mesmo caminho. Tudo era muito igual, e nenhuma pena caiu do céu em minha homenagem. Nenhum pássaro cantou diferente. Os ponteiros do relógio, mesmo daqueles que não tem ponteiros, continuaram a marcar as horas, até completarem as vinte e quatro do dia em que morri; e depois continuaram sua marcha marcando o dia seguinte ao da minha morte, sem se importar com quem ficou para trás, atrasado, perdido ou morto no tempo. 
Eu não sei a que horas foi que morri, que não uso relógio de pulso.
No dia em que morri não aconteceu nada que algum jornal pudesse dar notícia, a não ser as mesmas que dão desde que existe jornal, apenas mudando as palavras, as pessoas e os lugares. 
Enfim, no dia em que morri, apenas foi um dia qualquer em um lugar qualquer, como qualquer dia em que eu não tenha morrido.

04/07/2019