Luiz Carlos Cichetto
Sempre fui um bom leitor. Desde garoto lia muito. De histórias em quadrinhos a clássicos brasileiros como Machado e Alencar; de livros de receitas da Dona Benta aos catecismos do Carlos Zéfiro. Lia de tudo, qualquer coisa que caisse à frente de meus olhos. Lia embalagem de papel higiênico e bula de remédio quando ia ao banheiro cagar; lia embalagem de preservativo antes de foder uma puta e propaganda em revista de mulher pelada. Qualquer coisa eu lia, lia qualquer coisa mesmo. De fichas técnicas em discos, contracapas e orelhas de livros a manuais de instruções de liquidificadores. E até notas fiscais eu lia. Poesia, prosa, prosa em poesia, poesia em prosa, tudo eu lia. Romance, ensaio, biografia, era tudo o que eu queria. Aí comecei a escrever, e então lia mais ainda. Queria ser igual, queria ser melhor que todos os que lia. Augusto, Baudelaire, Charles, Huxley, Orwell eram minha sobremesa, meu café da tarde e meu jantar e meu remédio para dormir, ou ficar acordado. Lia, lia, lia. Lia até a mim mesmo, o que eu escrevia. E as vezes me achava bom, às vezes não. Eu sabia o que queria. E quanto mais eu lia, mais eu escrevia. Agora não sei. Depois de tantos anos, e já se foi meio século nessa brincadeira de ler que me esqueço de ler. Além dos olhos cansados e os braços um tanto curtos para enxergar um livro, há a canseira de alguém que tanto leu, que se esqueceu o que era seu. Não leio mais. Escrevo sem ler. Afinal sou um escritor, e escritores precisam ter tempo para viver.
30/09/2019
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