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09/03/2018

Diálogo Real Entre Dois Pensadores Com Ideologias Políticas Diferentes, Sobre Individualismo Ao Som de "2112"

Dimitri Brandi de Abreu : - Salve, meu caro!! Hoje foi aquela aula sobre liberdade, em que citei a Ayn Rand. Cara, que desanimador. Defender a liberdade hoje está muito difícil. Salvo duas ou três alunas, a maioria acha que o Estado pode tudo. E isso à direita e à esquerda, não é da ideologia, é autoritarismo encarnado mesmo.
Luiz Carlos Cichetto - É, meu amigo... Isso é fartamente perceptível em qualquer conversa, em qualquer lugar. Percebo claramente que o problema, ao contrário do que a maioria deduz, não seja efetivamente a ideologia. Ela é apenas uma desculpa, aliás, muito esfarrapada, já que é estudada e compreendida por poucos. Percebo isso desde as pessoas mais "simples", às mais "cultas". A ideologia é sempre o bode expiatório. O que impera é o autoritarismo, que é expresso das mais variadas formas, até mesmo num pequeno e simples comentário de uma rede social, que aliás, se nutre disso em proveito próprio. É desanimador perceber isso. Para mim, é mais que isso. É letal. Sinto de fato como se efetivamente estivesse totalmente fora desse mundo, o que acabou me gerar uma apatia letal.

Dimitri - Letal mesmo. as pessoas não percebem onde isso leva. e não é falta de cultura, veja, estou dando aula em uma universidade, é de se esperar que os alunos saibam o que foi o nazismo, o stalinismo, a ditadura brasileira, a inquisição... o autoritarismo não é só político, está na nossa vida cotidiana, com o discurso moralista, as ofensas, as restrições à liberdade de expressão, à liberdade artística... Quando falei da Ayn Rand mencionei o disco do Rush. Ninguém tinha ouvido falar... Veja que a falta de cultura e a ignorância abrange o campo cultural também
Luiz Carlos - Triste isso... Olha, há um tempo eu participei de um debate numa rádio comunitária e afirmei, para desespero de um jornalista politicamente correto, que vivíamos num tempo em que tudo se pode e ao mesmo tempo nada se pode... Isso remete àquele nosso papo de "se tudo é preconceito, nada é preconceito" e outras nuances. A falta de interesse , penso, vem de encontro a isso. E faz com que se tenha uma atitude autoritária sem o conhecimento. E ademais, no meio dessa confusão toda, a liberdade de expressão também perde seu valor, pois é tratada com uma mera expressão desse autoritarismo. Então, tudo vira despotismo. Tudo vira ditadura. E só pra amarrar mais aquelas nossas conclusões, uma pergunta: se tudo é ditadura, nada é ditadura?

Dimitri - Hahaha boa pergunta. O que me chocou hoje é que percebi que não só a liberdade de expressão está ameaçada, mas todas as liberdades. contei a história do 2112 e ninguém pareceu chocado com um mundo em que não existe "eu". se esse tipo de fantasia distópica soa aceitável, imagine no que podemos evoluir, onde isso vai parar...
Eu estava errado, achava que essa geração era individualista. Não são. Não dão qualquer valor ao indivíduo. Não sei os definir.
Luiz Carlos - Eu sempre achei que não eram individualistas, são de fato egoístas. O que é bem diferente, ao contrário do que maioria conjectura e acredita. Sempre bati nessa tecla, que são absolutamente distintas. Já tive discussões enormes com pessoas ditas esclarecidas sobre isso. É um erro, praticado principalmente pelo pessoal da "esquerda" , nem sempre inocente, em confundir e induzir ao erro, colocando o individualismo como egoísmo, em contraponto ao socialismo e comunismo. Um exemplo: na gestão do Haddad havia, na implantação da bandeira de governo dele, as ciclovias, um cartaz em todos os ónibus com a seguinte frase: "individual ou coletivo, o que é melhor para São Paulo?" A burrice e a confusão, além da indução ao erro já começa pelo fato de que a bike é um transporte individual... E tudo quase seguiu a isso - e presenciei absurdos, foram demonstrações de que o que imperou ali foram interesses egoístas, nãoindividualistas. e muito menos socialistas.
Luiz Carlos - E muita gente afirma que o pensamento da Rand era sobre egoísmo, mais um erro grotesco: é sobre o individuo. Essa conversa vai longe.... rs

Dimitri -  Eu concordo contigo quanto à diferença entre individualismo e egoísmo. apesar de ser socialista, não sou um coletivista, no sentido de acreditar que o coletivo é melhor que o individual. pelo contrário, acho que o capitalismo oprime o indivíduo pq obriga a todos a adotarem padrões de consumo e de trabalho. no meu pensamento, a realização plena do indivíduo vem com a libertação, e uma das formas de libertação é a liberdade econômica. Não é a única. a libertação sexual, por exemplo, é tão ou mais importante. E muita gente confunde a Ayn Rand com egoísmo. acho que é um problema de tradução. "self" em inglês tem um sentido de "ego", mas sem o lado pejorativo que atribuímos a esse termo. Ego no sentido de "eu", como na psicanálise. E, realmente, essa conversa vai longe. o que me preocupa e entristece é que muitos optam pela ignorância, ao não se aprofundarem nesses temas.
Luiz Carlos - Sim, acredito que a confusão venha daí, mas não descarto que haja má intenção nisso. Quanto li a tradução de "Anthem", o texto do tradutor me chamou a atenção, por ele explicar a preocupação de usar "Cântico", e não "Hino", como seria a tradução, segundo ele mais próxima. Será que há essa preocupação em outros? E ademais, a interpretação, a meu ver, de "egoísta" à filosofia de Rand é, como de resto, proposital, no sentido de desmerecer.

Dimitri -  Concordo! não só com a diferenciação, mas concordo também que há má-fé nisso.
Luiz Carlos - Quanto ao que fala sobre liberdade, concordo contigo totalmente. E essa preocupação é também a minha, embora eu já tenha simplesmente desistido de me entristecer como o futuro da humanidade. Infelizmente, tornei-me um cínico. E isso nos vários sentidos da palavra, inclusive o da corrente filosófica.

Dimitri -  Talvez haja um movimento pendular, e a liberdade volte a ser valorizada, como foi na década de 1960 (eu acho) e no período das revoluções liberais contra o antigo regime. Só defende ditadura quem nunca viveu em uma. com esse crescendo de autoritarismo, muitos vão perceber que a troca não vale à pena.
Luiz Carlos - Olha, meu amigo, eu sincera e honestamente não creio nisso. As facilidades oferecidas por esse sistema vigente são altamente vantajosas para alguns. A não ser que haja algum tipo de cataclismo, holocausto, coisa assim...rs. 

Dimitri - São vantajosas para alguns, mas não para todos, nem para a maioria. a massa idiotizada só não percebe porque, como toda massa, age "liderada" por aproveitadores que dominam a retórica vazia da manipulação. Esse modelo se esgota com o tempo, essa prática não tem como durar
Luiz Carlos - Sim, mas essa massa tem a ilusão criada, e gosta disso. Gosta de ter tecnologia, e de gosta dos prazeres e facilidades. E espero que você tenha razão, em acreditar no esgotamento desse modelo. É possível, sim. Até pela física - a fadiga de qualquer material... Mas não creio que nenhum de nós dois verá isso. Eu não verei com certeza. Tudo isso me empurra para um desejo eminente de morte, se não física, mas como indivíduo...

Dimitri -  Não desanime! sei que seu filósofo favorito é o Cioran, mas ele tinha 20 anos quando escreveu.
Luiz Carlos - É um sentimento forte demais. Quando escrevi sobre suicídio no Face há um tempo, e até você comentou sobre, era - e é - uma coisa forte demais, muito além de simples filosofia. E coisas como essas que falamos aqui hoje, esse desencanto que você sentiu... Imagine tudo isso amontoado em 60 anos de vida de um sujeito que era criança e cresceu e se tornou adulto dentro do regime militar, que sempre foi sensível e critico, que virou sua geração se perder e aquele que ele ajudou a construir completamente corrompida.

Dimitri -  Imagino o seu desânimo, compartilho (parcialmente) dele e posso entender o que você sente. Mas temos um defeito: somos artistas. Dá para deixar o registro, a indignação, sem nos preocuparmos se ela reverbera ou não. Sem nos preocuparmos se seremos louvados ou odiados. A mensagem tem que ser passada, e nisso você é importante.
Luiz Carlos - É... Essa é exatamente a diferença entre individualismo e egoísmo... rs

Para comprar o livro de Ayn Rand: "Cântico": https://www.saraiva.com.br/cantico-9055600.html
Texto Original em Inglês: http://www.gutenberg.org/ebooks/1250?msg=welcome_stranger

08/03/2018


23/02/2018

Madrugada

Madrugada
Luiz Carlos Cichetto (aka Barata)

Penso deliberadamente que madrugada não é o particípio passado feminino substantivado de madrugar. Madrugada é um estado de espírito, um espaço físico, algo que pode mesmo ser chamado de um lugar. Um local onde não tem pipoca, nem vendedores de sorvetes, nem putinhas fazendo ponto de minissaia, como havia antigamente. Madrugada é um lugar. Onde não se pode namorar. Nem trepar. Nem gozar. Madrugada é um lugar. Vulgar. Lugar de divagar. Devagar. De vagar. Pelas câmaras escuras da solidão. De largar o corpo dormindo na cama. E encontrar uma bela megera num submundo. Madrugada é lugar onde é proibido dormir, mas que pode sonhar. Madrugar é pegar. Ou largar. Sugar. Sujar. Mijar. Madrugada é chegar. Onde não se pode estar.  Cegar. O olho do cu. Cagar. Devagar. Sem pressa. Madrugada é uma rua. Onde cachorros latem de solidão. Uma estrada sem destino. Um puteiro com luzes de neon com o desenho de uma silhueta de mulher e uma taça. Madrugada é uma praça. Madrugada é uma taverna. Ou uma taverna. Onde um poeta estúpido e idiota ainda teima em escrever poemas. Que ninguém vai ler. Na madrugada não é proibido fumar. Não é proibido nadar pelado. Num lago gelado. Madrugada é uma cidade. Sem prefeito. Sem nada perfeito. E de qualquer jeito. Madrugada é um direito. Lugar estreito. E escuro. Seguro. Confortável. Inflamável. Instável. Madrugada é um país. Sem presidente. Nem rei. Nem política. Nem religião. Madrugada é região. Penhasco. Montanha. Floresta. Madrugada é tudo o que resta. E que não presta. Madrugada não se empresta. Nem se compra. E não se pode alugar. Madrugada é risco. Madrugada é anarquia. Monarquia. Autarquia. Madrugada não é estar. É ser.

23/02/2018

20/02/2018

Sexo

Sexo
Barata Cichetto

Poderia ser dramático, mas é apenas gramático; e matemático. Poderia ser desejo, mas é apenas beijo; e ensejo. Poderia ser prazer, mas é apenas lazer; e fazer. Poderia ser delícia, mas é apenas malícia; e sevícia. Poderia ser tudo, mas é apenas sexo; e nada.

20/02/2018

17/02/2018

Vaca Com Tosse

Vaca Com Tosse

"O pulso ainda pulsa". Ainda pulsa. Expulsa. Repulsa. Por justa causa. Injusta pausa.  E quem casa quer casa. Mas a asa ainda bate. A crase acentua. Acento grave. Grave acento. Ao vento. Que vem do norte. A fase. Atenua. Nua. Crua. E não for sua. Nada será. A não ser que seja. De manhã. Quando eu acordar. E você me chupar. E depois adormecer. Com a cabeça no meu peito. Se afogando no leito. No leite. E tudo aquilo que foi feito. Mesmo que imperfeito. Foi feito. Pelo Sol. Pela Lua. Pela sua. Mão. Tudo pelo seu não. E se não me engano. Tudo entrou pelo cano. Da solidão. E o senão. Foi a regra. E então. Tudo se foi. Como dois e dois. Ficou para depois. A resposta certa. Na hora errada. E se pulsa o pulso. Eu tusso. Vomito. E emagreço. Por doença. E solidão. E dor desejo e vontade. Te fodo a buceta. Te enrabo na cama. E te chamo de vaca. E nem que tussa. Te faço parar de gozar. É gozado isso. De te fazer gozar. Feito uma vaca. E te chamar de piranha. Depois tomar teu café. E comer teu pão. Te ver sair pro trabalho. E ficar batendo punheta. Na frente da televisão. Dormir a tarde inteira. Cheio de tesão. E cantar uma musica. Que não entendo a letra. Pensando que é filosofia. Depois dar uma cagada. E no alto dos meus sessenta anos. Folhear uma revista de mulher pelada. E lambuzar o azulejo. Feito um moleque. Imberbe. Com cara de anjo. E jeito de filho da puta. Ainda penso em foder com uma puta. Mas tenho medo. De brochar. E de pensar. Que estou fodendo tua buceta. E ver na cara daquela vagabunda. Teu rosto me censurando. Então fico no ponto. Te esperando. Sem cuecas. Com o pau duro debaixo da bermuda surrada. E te fodo assistindo televisão. E fumando. E jogando no celular. Feito a puta da minha adolescência. Que comia maçãs. Compradas de um carrinho de frutas na esquina. Mas o pulso. Ele ainda pulsa. Mesmo que por repulsa.

16/02/2017

16/02/2018

Barata Rocker

Em 2012, se minha memória pós-etílica não falha, o Diego El Khouri criou um personagem embasado em mim, o que me encheu de orgulho, afinal, Diego é sujeito que, apesar de muitas birras e teimas, eu admiro muito. De certa forma, tenho a ele como uma espécie de "filho" poético, num sentido muito amplo, e tirando daí qualquer sentido de "superioridade" ou conotação de maior experiência.

Ano passado, Diego me convidou a fazer com ele a HQ "definitiva" da personagem, que ocupará um álbum inteiro, possivelmente lançado pela Editor'A Barata Artesanal. Como ando totalmente desanimado e perdido, não consegui até agora fazer nada.

Acontece que na última noite eu tive um sonho, em que estava com uma revista nas mãos e a capa tinha um grafismo, um logo... Era uma HQ do "Barata Rocker". Acordei, fui ao computador e desenhei tal grafismo, montando numa arte que o Diego El Khouri já tinha feito.

Então, vamos às artes!





10/02/2018

Vontade e Impotência

Vontade e Impotência

Primeiro eu parei de postar sobre qualquer assunto relacionado à política: cansei de ser ofendido por malucos esquerdóides. Depois parei de comentar em postagens de outras pessoas sobre o mesmo assunto e pelos mesmos motivos. Na sequencia parei de publicar poemas, por absoluta falta de leitores e de comentários: responder a uma postagem poética com um curtir é o mesmo que ir a um puteiro e pedir revista Playboy na recepção. Então, parei de publicar constantemente qualquer outro tipo de texto, pelos mesmos motivos, com exceção de desabafos feito este.
Neste ano de 2018, onde uma guerra ideológica com armas mais nojentas e imundas que bomba atômica se prevê, nada para mim faz mais sentido aqui. Só não removo a conta nesta  rede anti-social por ainda tem não mais que meia dúzia de amigos.
Sinto-me completamente perdido nessa era em que as pessoas andam nas ruas usando celulares, e não o soltam nem na cama. Perdido e sem nenhum tipo de esperança. Já cheguei a sonhar que por algum vírus poderoso todos os celulares e redes sociais deixassem de funcionar. Ai, as pessoas voltariam a ter que fazer um exercício extremo de voltar a aprender a segurar uma caneta e um pedaço de papel. Sim podem me chamar de saudosista. Aliás, podem me chamar do que quiserem, que não ligo mais.
À beira do meu sexagésimo aniversário, com o corpo dando sinais de fadiga e ruptura, e  vendo todas as oportunidades de sobrevivência se esvaírem, cada despertar se torna uma agonia, cada noite uma tortura. O que importa tudo o que foi feito, de bom ou de ruim, dependendo do ponto de vista? Já não importa. Talvez o que importa seja a corda, a garrafa de alguma coisa bem forte e mortal, a bala, o sangue. Não sinto, entretanto, pena de mim. O sentimento é outro... O de injustiça. Enquanto sou acusado de misantropia, vejo "amigos" falsos humanistas, falsos esquerdistas, falsos moralistas, erguerem bandeiras em defesa do coletivo, enquanto individualmente têm atitudes repugnantes de deixar morrer à míngua um irmão.
Falta-me a vontade de tudo, falta-me a vontade de erguer um dedo, e até de ter medo, de ter  segredos; de acordar cedo, de dormir tarde, de falar a verdade, de mentir, de partir. De ficar.

29/01/2018

Soturnalha

Soturnalha
Luiz Carlos Cichetto

Sorrateiramente espreito por portas trancadas, e nelas encontro também tristezas identificadas, com documentos, certidão de nascimento, titulo de eleitor. Elas têm rostos, mas não têm mais faces, o que as tornam identificáveis, mas não verdadeiras. Tem identidades, mas perderam a identidade. São vitimas de mim? Ou são meus carrascos? Refaço os meus passos todos até a porta, olho para trás e as pegadas estão lá: são mesmo minhas. Atrás dessas portas trancadas não há mais nada a não ser rancor, inveja e desrespeito. Entreguei-lhes a chave da porta, e eles trocaram o segredo. Chamaram um chaveiro ladrão para ajudar. Trocaram segredos com o chaveiro, e as portas não podem mais ser abertas. E agora começa a chover. Fico na chuva, do lado de fora da porta que abri que abri num muro cerrado. Lá dentro não há mais lugar para mim. Estão muito ocupados com seus jogos e planos. Identifico cada rosto daqueles. Conheço a cada um, mas naqueles rostos há apenas... Indiferença. Triste, quero sair andando, sem olhar para trás. Mas não há aonde ir. Todas as rotas de fuga também estão trancadas. Espreito. Estreito. 

23/04/2017

25/01/2018

Tempos Grossos 2

Tempos Grossos 2
Barata Cichetto

Penitenciárias cheias de inocentes
E as praças repletas de culpados
Nas igrejas choram os descrentes
E nas escolas marcham os soldados.

Nesses grossos tempos cheios de dor
Choram as crianças de armas na mão
Criminosos beijam a mão do ditador
E a saída é a escura, e o único portão.

O crime que lhes compensa é o crime feito
Pelo amigo do peito, o amante do prefeito
E a morte justificada pela ideologia padrão
Enquanto eu aguardo um tiro no paredão.

Cegos estão surdos, surdos estão mudos
E todos caminham mortos em segundos
Agitam as bandeiras e comem da própria merda
E nesses tempos grossos morte é o que se herda.

25/01/2018

23/01/2018

Não Há Bondade Sobre a Terra

Não Há Bondade Sobre a Terra
Luiz Carlos Cichetto (Barata)

Serei eu, uma criatura monstruosa, a única a não acreditar na bondade como fator humano inerente? A não crer que não há nas crianças tal sentimento, pervertido pelo contato com a sociedade? 

Serei eu, o poeta desencantado, o único a acreditar que não existe a bondade? Que a bondade é uma ilusão interesseira, uma ideia implantada à força durante séculos de dominação religiosa? Um conceito religioso, criado para manter as pessoas num estado de letargia moral? A deidade símbolo da cristandade judaico-cristã, ela mesma é a própria negação do seu próprio conceito, pois ao mesmo tempo em que tal deus é pintado como exemplo maior de bondade, nele são atribuídas características que o transformariam no próprio mal encarnado. 

Serei eu, apenas eu e mais ninguém, o único a acreditar que pureza não é sinônimo de bondade, mas sim da própria negação de tudo que é conceito? Nascem as crianças puras, sim, isentas da bondade, mas, séculos de doutrinação as embute de ideias e objetivos de bondade, baseados única e exclusivamente em dogmas instituídos pela religião?

Serei eu, o único a acreditar que a tal bondade e a justiça nada tem a ver, já que a justiça, para que assim seja completa, necessita estar distante de quaisquer conceitos religiosos? E ainda, eu, como construtor de palavras e vitima de sua própria construção, um clamor isolado dentro de um deserto de sentimentos puros? Eu, um ser desalmado, por estar exatamente isento de alma, de espírito e do bem, o único ser vivente a acreditar que é a maldade, esta sim, compositora da natureza humana, muito mais do que a de qualquer outro animal sobre a face da Terra? Pois se tanto, serei eu, que desde o nascimento me debato contra os conceitos impuros de dogmas religiosos, ao agir sem sentimentos de bondade, e a lutar pela intrínseca natureza das pessoas e das coisas, em seu estado mais latente? A não crer na bondade das crianças, nem dos idosos? 

Sim, serei eu, o maldito, quase idoso e potencialmente perigoso, o poeta profeta que nas lides das manhãs ensolaradas desacredita do Sol, da manhãs e das profecias?

Serei eu, sim, o bruxo das redondezas, o mago das tristezas, o ser lúcido e lúdico a acreditar que nas mulheres há muito mais desejo que nos homens, e que só a elas a natureza propicia a distinção entre o bem e o mal, não como conceito religioso, mas essencialmente humano?

E eu, como um deus ateu, que não crê em sua própria existência como deidade, mas como entidade humana, declaro que há no nascimento humano um prazer sexual supremo, que nos faria livres, não fossem os crimes perpetrados pelas igrejas e absolvidos por elas próprias.

Que venham à luz, seres humanos sem bondade que nos causem orgasmos e não dores em seu nascimento.

À luz!!!!

25/12/2017

22/01/2018

Caneta Vermelha

Caneta Vermelha
Barata Cichetto

Ontem apanhei um papel e uma caneta. Há tempos não escrevia assim. Deu saudades. A caneta era vermelha. Há tempos só uso caneta vermelha. Odeio azul ou preta. Elas me lembram escolas e escritórios. A vermelha me dá a sensação de estar escrevendo com sangue. Me dá a sensação de ser um professor corrigindo uma prova de um mau aluno. Um professor dando um zero enorme a um aluno rebelde que insiste em rabiscar um poema no lugar da resposta sobre o dia-mês-e-ano em que Dom Pedro proclamou a independência. E esse aluno era eu mesmo. Então, por consequência, escrever com uma caneta vermelha me lembra efetivamente de mim. E penso que é por isso que escrevo: para lembrar de mim mesmo, pensar que apesar de todas as notas zero que tirei nessa escola em que o diploma é a certidão de óbito, ainda quero estudar, aprender. Lembrar da minha professora do terceiro ano primário sentada com as coxas à mostra, sobre a mesa de madeira, daquela escola de madeira, que tinha um diretor que puxava a cinta e tinha um Gordini Bordô, e lembrar do meu amigo crente, o primeiro que eu lembro, não por ele ser crente, mas por ser meu primeiro amigo; e lembrar que ainda posso escrever poemas em provas de história, de geografia e de matemática. Escrever com caneta me faz lembrar uma punheta, escrever com vermelha me faz lembrar o puxão de orelha, da professora gorda e perversa; escrever à mão me faz lembrar do não que recebi de todos os que não leram o que escrevi. Escrever, efetivamente, me faz lembrar de viver.
22/01/2018