Barata Cichetto
Ontem, caminhando numa avenida movimentada no centro de Araraquara, com minha barba e cabelos quase todos brancos e longos, cruzo com uma senhora de cerca de uns 80 anos. Ao passar por mim, ela diz algo que não entendo. Paro e pergunto à idosa: "O que a senhora disse?". E ela: "Eu disse pra mim mesma: eu sabia que Jesus voltaria. E agora estou vendo." E deu um gostoso sorriso. Fiquei uns segundos longos olhando para ela, querendo falar alguma coisa. Nesse tempo um milhão de coisas me passou na cabeça. "Sou ateu. Tenho quase o dobro da idade de Cristo quando morreu. Muito obrigado. A senhora é simpática. Ah, eu não sou não, estou mais pra demônio que pra santo." Foram algumas delas. Mas apenas lhe sorri e continuamos, cada um em sua direção, nossa caminhada. Eu nunca a tinha visto, e possivelmente jamais a verei. Ela não sabia quem eu era, e eu muito menos que é ela. É claro que a senhora não é doida, não me confundiu com nenhum Jesus, mas sua atitude simpática e sorridente me associando a alguém que para ela deve ser o símbolo máximo de bondade, paz e justiça, me fez perceber que, acima de quaisquer dogmas, quaisquer crenças, e seja lá o que nos desune, sempre haverá pessoas capazes de nos atribuir, pela própria bondade, um sentimento bom, mesmo que não tenhamos. Então, é Natal... E eu continuo como ateu. Não há deuses, existem pessoas.
18/12/2019
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