O CONTEÚDO DESTE BLOG É ESPELHADO DO BLOG BARATA CICHETTO. O CONTEÚDO FOI RESTAURADO EM 01/09/2019, SENDO PERDIDAS TODAS AS VISUALIZAÇÕES DESDE 2011.
Plágio é Crime: Todos os Textos Publicados, Exceto Quando Indicados, São de Autoria de Luiz Carlos Cichetto, e Têm Direitos Autorais Registrados no E.D.A. (Escritório de Direitos Autorais) - Reprodução Proibida!


26/10/2018

Não Tenham Piedade de Mim!


Não Tenham Piedade de Mim!
Barata Cichetto

"Senhor, tende piedade de mim!", pedem as senhoras católicas de joelhos calejados e mãos postas; tende piedade de mim, grita a perversa enquanto lhe atravesso o útero; tende piedade de mim, implora o mendigo quando quer do cigarro que acabei de comprar; tende piedade de mim, grita o comunista; tende piedade de mim, berra o fascista; tende piedade de mim, chora o artista; tende piedade de mim, implora o masoquista; tende piedade de mim, rogam minha mãe, meu pai e meus filhos; tende piedade de mim, oram o padre, a freira, o satanista e até a puta da esquina; tende piedade de mim, pede o poeta com seus versos ridículos sobre amores e flores; tende piedade de mim, pede o doceiro, o açougueiro e o cozinheiro com facas na mão; tende piedade de mim, pede o batedor de punheta e até o cachorro da sarjeta; tende piedade de mim, implora minha mulher, minha amante e as três concubinas de cada uma delas; tende piedade de mim, pede o locutor da rádio, o pastor da igreja pentecostal e até o ator de fundo de quintal; tende piedade de mim, pede o sujeito que rouba minha carteira; tende piedade de mim, implora a aborteira; tende piedade de mim, implora o banqueiro, o traficante e o senador; tende piedade de mim, implora o coveiro, e até o defunto; tende piedade, tende piedade de nós. Todos pedem por piedade. E até o carrasco de machado na mão, e o ditador democraticamente eleito, querem a piedade daqueles que sacrificam. Não tenham piedade de mim!

23/10/2018

23/10/2018

A Poesia Está Fedendo!

A Poesia Está Fedendo!
(Ao amigo Joka Faria)
Pintura: Barata Cichetto, "085 - A Leitora ", 2017 - Tinta látex sobre papel Paraná

Ora, pois, que sejamos sinceros: a poesia morreu. Inanição. Há muito deixaram de alimentá-la. À parte alguns poucos que bradam, que pedem para que não a deixemos morrer, ela é apenas uma carcaça moribunda, fedendo e estorvando na calçada. Sim, sejamos sinceros. Pense bem consigo: quando leu, ou melhor quando abordou pela ultima vez a poesia. Abordou, sim, ou seja, chegou perto, tocou, sentiu, perguntou do que se tratava, aonde ia, coisas assim.  Quando foi que comprou, e leu, um livro de poesia? Seja sincero. Não com a sinceridade da poesia, mas com a sinceridade da medicina. Ler poesia em Facebook é o mesmo que falar sobre as vantagens da virgindade num puteiro, sobre as virtudes da honestidade no congresso. Falam sobre livros de poesia, poetas boquirrotos brandindo seus últimos lançamentos por editoras que lhe arrancam o os olhos da cara e as pregas do rabo para terem o prazer vaidoso de ter seu nome numa capa colorida. Gatos mijam sobre livros de poesia, pombos cagam. Não há mais poetas, apenas escrivinhadores de palavrinhas bonitinhas para impressionar a garota que o sujeito ou a sujeita quer comer na balada, com a cara cheia de energético e uísque falsificado. Esqueçam a poesia. Se querem escrever alguma coisa, arrumem emprego num escritório de contabilidade, façam um livro de receitas veganas ou sobre como encontraram uma monja despida aos pés do monte karnal. O século vinte e um, que deu razão a Piva, um dos últimos poetas verdadeiros, matou a poesia. Poesia não rima com tecnologia, tela de computador com fundo azul, feito esta onde escrevo essa verborrágica vomitória sobre a morte da poesia. Ora pois, sejamos sinceros, deixemos que a poesia descanse em paz, já que neste mundo não há lugar onde ela possa respirar. Desliguem os aparelhos, pisem na mangueira. A poesia está morta. Viva a Poesia! Calem-se!

23/10/2018

Tempos do Caralho

Tempos do Caralho
Barata Cichetto
Pintura: Barata Cichetto: "032 - Selfie Sem Vergonha", látex sobre papel Paraná

Tempos bicudos, tempos rotundos, tempos grossos, rabos abanando cachorros, pássaros sem cor, mudos e vagabundos; a política, não a poesia, disse o charlatão; a poesia moribunda inunda de sangue o mar; sangra, se afoga, revoga a lei, do Universo; meu verso, meu inverso: acionem o reverso; liguem os motores de proa, minha prosa, mote e glosa; o barco bêbado, encharcado de rum; tempestade a estibordo, grita o marinheiro, o comandante grita: todos a bordo, ratos correm pelo convés e um pirata com a faca entredentes tem sangue nos olhos; tábuas rangem estridentes, bandeiras rasgadas, usadas como papel higiênico, epidêmico, endêmico, sistêmico; viés satânico no horizonte; abandonem o navio, grita o marinheiro no alto do caralho do navio; lua de sangue, mar de lama, mulheres e crianças aos botes, comunistas ao mar, políticos aos tubarões, barões empalados, portos distantes, furacão a bombordo, todos a bordo; chamem Rimbaud, o capitão, o barco bêbado atravessa a tormenta, chamem Messalina para a diversão; o balanço aumenta meu enjoo, alimenta meu nojo, marinheiros tomam rum e quebram as garrafas no tombadilho, e o estribilho é uma letra de funk: estão todos mortos, são apenas esqueletos que dançam, como num velho desenho animado; a água inunda os camarotes; ricos e ratos e gatos, salve-se quem puder; a orquestra toca a canção de despedida, o barco afunda, água salgada à altura da bunda. Iceberg, Zuckerberg e outros bergs gritam que não são culpados: gente demais na embarcação; e ainda há um poeta, com um canivete na mão, entalhando na madeira podre do barco suas ultimas palavras, um verso torto, que irá boiar, como o ultimo pedaço podre de poesia, até que a água salgada desfaça o verso e a madeira: não há mais poesia possível num mundo que se afoga no seu próprio vômito.

23/10/2018

22/10/2018

Eu Vovô

Eu Vovô
Barata Cichetto
Pintura: Barata Cichetto, "Oral" 2016 - Látex Sobre Papel Paraná

Vovô viu a uva. Eu vi a vulva. Eu vovô viu a vulva. E chamou de uva. E chupou. E eu vovô viu vovó. E nela uma uva. E a chupou até o caroço. Da uva. Da vovó. E a vulva da vovó é uma uva. Que eu vovô quer chupar. Eu vovô viu a uva. E vovó vulva quer fumar. Vovô uva, Eu, quer vulva. Vovó vulva quer fumar. Vovô viu algum cigarro? Pra vovó chupar? Vovô saiu na chuva. Pra vovó vulva fumar. Vovó ficou viúva. E agora parou de fumar. 

20/10/2018

Ciao, Bella!

Ciao, Bella!
Barata Cichetto
Pintura: "Virgin Bell", Barata Cichetto, 2017, Tinta Látex Sobre Papelão

Eu fui poeta. E fui por ter sido, e fui por ido. E eu fui, sem ir a lugar nenhum, em nenhum compêndio, nenhum prêmio, nenhum concurso, nenhuma editora. E fui poeta, fui por sido, fui por ter ido, aonde ninguém quis chegar. Quem sabe Piva chegou. E chegou longe. Mas em sua época ir longe era ir até o Teatro Municipal, ou à Biblioteca Mário de Andrade, e ter livros editados por editores undergrounds. Aos sessenta Piva já tinha chegado, aonde eu nunca cheguei, nem chegarei. Eu nem sei por que. Qual foi meu erro? Qual meu acerto. Olho com tristeza publicações e vejo nomes de conhecidos, pessoas que chegaram, ao menos em algum lugar. Eu sai do meu. Acho que não quero mesmo chegar. Fui escorraçado por família, amigos e parentes. Sobraram meia dúzia, se muito, a ainda bater nas minhas costas, e dois ou três comprar meus livros que eu mesmo faço, já que nenhuma editora quer publicar. Estou conformado de ter sido sem nunca ir, de ir sem nunca ter sido. São Paulo não quis minha poesia, Araraquara não quer minha poesia, o Inferno não quer minha poesia, nenhum deus ou deusa quis minha poesia.  O que fazer com as pilhas de papel, com as centenas de arquivos de computador? Quem sabe sentar numa praça e ler aos pombos, que decerto me cagariam na cabeça.

22/10/2018

20/10/2018

Ode à Mão Direita

Ode à Mão Direita
Barata Cichetto

A minha mão direita é que me importa. Sou totalmente destro. Não que me orgulhe, queria ser ambidestro. Não sou sinistro, como se dizia antigamente. Minha mão direita fica à minha direita, a esquerda de quem me olha de frente, e à direita de quem me olha pelas costas. Minha mão direita não é estreita, não usa luva; e segura uma uva e uma vulva, me protege da chuva. Minha mão direita é minha eira, e minha beira. Tem cinco dedos, unhas curtas que não roo. Minha mão direita enfrenta tapas de mão esquerda. E socos de mão direita. Minha mão direita é feita para bater, para alisar, para fazer gozar. Serve para estapear e, principalmente para escrever, já que o faço a caneta, com a mão direita, e não em ambidestros teclados de computador. Ah, minha mão direita, que aceita o que pode, e bate em quem não pode. Minha mão direita é direita, nunca foi desonesta, nunca pegou nada de ninguém. Minha mão direita é minha liberdade. Minha mão direita se apoia sobre meu coração à beira de um enfarto. Minha mão direita segura meu caralho, e as cartas do baralho. Minha mão direita, que coça minhas próprias bolas do saco, segura seu casaco e penteia macaco. Com minha mão direita bato punheta, seguro caneta e afago buceta; abro e dou tapa, fecho e dou murro; seguro o cigarro e amparo o escarro. Minha mão direita é aceita, perfeita para o adeus, para o aceno e para o aperto de mão. Minha mão direita é minha mão do não. E minha mão do sim. Minha mão direita é minha mão, e dela não abro mão. E se sua mão esquerda é sua certeza, não critique minha destreza. A sua mão esquerda é a minha mão direita. O importante é a mão não a luva. O importante é a mão, não o que ela segura.

20/10/2018

19/10/2018

Roberto Piva: O Século XXI Lhe Deu Razão

Roberto Piva: O Século XXI Lhe Deu Razão
Barata Cichetto

O século XXI lhe deu razão; com seus coletivos egoístas, e seus egoístas coletivos; seus seletivos anarquistas, e seus anarquistas seletivos; seus computadores baratos, e seus celulares caros; seus ditadores de esmola, e seus educadores sem escola; seu analfabetismo político, e seus políticos analfabetos; suas mulheres plastificadas, e seus machos simplificados; suas crianças fascistas, e seus bebês tecnológicos; sua fome gourmetizada, e sua violência glamourizada. 
O século XXI lhe deu razão, com seu excesso de tesão, e sua falta de desejo; seus pode-tudo, e seus nada-pode; sua moral ressentida, e sua imoralidade consentida; seu fanatismo ideológico, e seu onanismo lógico; seus ódios escarrados, e seus ócios cuspidos; seus cupidos tecnológicos, seus bêbados ideológicos; seus zoológicos humanos, e seus humanos lógicos; seus cérebros de silício, e suas alças de silicone; seus drones, e suas câmeras de seguranças. 
O século XXI lhe deu toda a razão, com seus idiotas poéticos, e seus poetas agiotas; suas águas coloridas, e seus filmes sem enredos; seus medos de tudo, e seus segredos de nada; seus escritores de Twitter, seus pensadores de Whatsapp; seus filósofos de Instagram, e seus Youtubers; suas hashtags, e seus emoticons; seus notebooks, seus facebooks, e seus smartphones.
O século XXI lhe deu razão, com sua morbidez feérica, e sua rapidez cadavérica; seus quinze minutos de fama, e seus dois minutos de cama; suas cobras de isopor, e seus lagartos de papel; sua falta de poesia, e sua afasia; seu progresso sem ordem, e sua desordem ordenada; sua devassidão clériga, e sua imensidão estreita; seus rocks sem roll; seu futebol sem gol, e seus blues sem cor.
O século XXI que lhe deu razão, com suas palavras ressignificadas, suas mulheres empoderadas, e suas tolices toleradas; suas intolerâncias generalizadas, e suas prepotências potencializadas; suas cotas de felicidade, suas botas de faculdade, e suas roupas de facilidade; sua pornografia sem tesão, e sua pornográfica razão; seu politicamente correto, e sua política incorreta; seu pensamento engessado, e sua burrice premiada. 
E o século XXII também lhe dará razão, Roberto Piva.

Barata Cichetto, do século passado, no século presente; e sem futuro.

17/10/2018