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20/08/2018

Poeta Maldito é Aquele Que Renega Sua Poesia. O Resto é Verbete da Wikipedia

Poeta Maldito é Aquele Que Renega Sua Poesia. O Resto é Verbete da Wikipedia.
Barata Cichetto

Um dia quis escrever um romance. Não terminei. Tentei outra vez. Não acabei. Tentei outra. E mais outra. Nenhuma cheguei ao fim. Nenhum orgasmo literário. Nada daquele prazer de dar o último enter no teclado depois da ultima palavra, do ultimo ponto final, do ultimo capítulo. Foram cinco as tentativas. E nenhum gozo. Só ejaculações precoces. Cheguei ao sexto. Terminei. Teve até revisão de um amigo escritor bem conhecido, sujeito que anda pela Europa e tudo mais. Um bom amigo, um grande escritor. Ele leu, releu, fez anotações. Imprimiu tudo e escreveu com caneta vermelha nos versos nas páginas as suas observações, além de anotar os erros de grafia e gramática. Mandei para uma editora. O editor queria dinheiro. Primeiro elogiou, teceu comentários ótimos e no final do email a facada. Mandei-o se foder. Desisti dos romances. Por alguns anos. Ano passado a sétima. A derradeira tentativa. Quase trezentas paginas digitadas em espaçamento simples, fonte doze. Isso daria um livrão, de mais de quinhentas páginas. Escrevi em vinte dias. Revisei em mais vinte. Em fevereiro, logo depois do Carnaval mandei para uma editora fodona. Dessas que tem serviço de imprensa organizado, que me manda email sobre os lançamentos deles todos os dias. E eu, belo idiota, às vezes até acredito que um dia receberei deles um email falando do lançamento do meu livro. Esperei. E a cada vez que toca o telefone penso que possa ser da editora com nome de emissora de televisão. Uma editora tão grande, que até comprou outras para ficar maior ainda. Quer ser única. Deve ser isso que querem. Alguém sempre quer alguma coisa. E as empresas são alguém. E querem ser mais alguém ainda. Será que eles não percebem que esse meu romance vai revolucionar as estruturas editorais? Claro que estou sendo irônico. Claro que não acredito que iria revolucionar porra nenhuma. Nem quero. O que queria mesmo era ter o prazer de ter o livro à venda numa dessas livrarias fodonas da Paulista, daquelas que tem sigla em lugar de nome, da outra que parece com raiva, coisa assim. Tem tenta livraria bacana em shopping e eu fico sonhando com aquelas meninas gostosinhas de bermudinha enfiada no rabo comprando meu livro. Ou aquele sujeito de terno e gravata comprando logo dois. Quem sabe uma dessas madames esticadas, com buceta cheirando lavanda e cheia da grana compra o livro e resolve que quer ter um amante escritor. Mudei para a terra do Ignácio. E fiquei pensando que eu poderia encontrá-lo comendo coxinha e dar a ele uma copia do meu original. E ai ele podia ser meu padrinho e ai o meu livro seria lançado na bienal. A bienal acabou. Só daqui a dois anos, claro. Se é bienal é a cada dois anos. Fiquei sabendo de Macunaíma. Macunaíma é a obra mais superestimada da língua portuguesa. Não acho que aquilo valha tanta coisa. Tanto estudo, tanta conversa. E acontece que eu queria escrever outro romance. Aliás, tinha a ideia para mais dois. Ou três. Mas acha que vou perder meu tempo escrevendo outro romance? Nem fodendo. Aliás, fodendo é que não vou mesmo. Fico pensando aqui com a fumaça do cigarro mais barato, que depois que eu morrer esses romances vão ser publicados e valerão dinheiro bom. Meus filhos podem ficar ricos. Mas eles são comunistas e não gostam de dinheiro. Eu gosto de dinheiro. Mas vou morrer também. Todos vão morrer: os que gostam e os que não gostam de dinheiro. Os comunistas e os monarquistas. Até os artistas vão morrer. E muitos não terão dinheiro nem para o enterro. E essa conversa já foi tão longe que eu não sei voltar ao começo. Escrevi tanta coisa, fiz tanta arte que deveria estar num hospício, num cemitério. Ou numa mansão. Por que não?
20/08/2018

01/08/2018

Em Casa de Barata Não Entra Lobisomem

Em Casa de Barata Não Entra Lobisomem
Barata Cichetto


Aquele a quem (nunca) chamaram de pai, nem de filho, não mora mais ali. Nem aqui. Mora acolá, na Morada do Sol.  Não mora mais na arte que construiu, não mora na escultura; não mora mais onde suas mãos calejadas e sangrentas construíram. Não mora mais no seu sonho, não mora mais lá, no pesadelo. O poeta que nunca leram não escreve mais lá, apenas algumas manchas do seu sangue estão esparramadas pelas paredes e pingados pelo chão. Misturadas às lágrimas. Deixei cada pedaço de madeira, cada prego e cada parafuso para trás. Fui escorraçado, pisoteado e humilhado - não pela primeira vez, mas juro que pela última - Ali podem encontrar meu primeiro quadro pintado, na parede. Ali podem encontrar quilos e quilos de papel e papelão, besteiras de decoração, pedaços de coração, e também alguns nacos da minha carne e dos meus músculos que rasgaram.  Não, o poeta que nunca leram, o poeta que nunca entenderam, não morreu, nem foi ao Inferno. Nem voltou. E agora sabe que o Inferno tem muitas paredes, e o Demônio caras diferentes. E mil dentes. Há o Inferno e existem os outros. São coisas distintas. Doravante, seguirei. Irei. Serei. Sempre sozinho como sempre fui, de fato. Mesmo que não esteja só. Trago comigo minhas filhas felinas, aquelas que sempre entenderam o que é liberdade, que sempre souberam o que é lealdade, que sempre souberam me olhar com carinho e respeito. Que sabem reconhecer cada gesto que faço. Minhas gatas não são comunistas, entendem de afeto, de reconhecimento e de merecimento. Aquele cantor que nunca ninguém escutou, agora calado, não lhes cantará uma canção. Ele já não tem coração. Nem adoração. Desfigurado, o poeta ludibria a própria morte. Esguicha sangue do corte. E resvala na beira do precipício. Não há caminho por onde não se possa andar. E aquele homem, que nunca foi distinto, que nunca usou um distintivo de autoridade, já não mora mais, não namora mais. Não chora mais. Morar e chorar rima com sonhar. E aquele que pediu socorro se cala. Diante de seu silêncio. A nova geração herdará a merda. Tudo se herda! E sem perda não há ganho. Dividir para conquistar é a tática marxista. De Karl e de Zuckemberg. Não quero preces. Nem foices. Nem martelos. Quero apenas o que é meu. Foi assim que ensinei. Foi assim que vivi. Foi assim que aprendi. E surpreendi. A mim mesmo por não saber ganhar. Perdi sem ser perdedor. Meus heróis estão na Academia. Brasileira de Letras. Na Feira de Paraty. Ou são membros da quadrilha. E eu, numa ilha. Náufrago que queima agora as ultimas caravelas.Não tem retorno. Nem rendição. Apenas a conquista. Ou a morte. Com sorte um império. É sério. Não sei mais rir. Nem chorar. Não lembro mais como se faz. Só quero que esqueçam. Deixem de procurar. Rasguem a certidão. Foi morrendo que aprendi a ser homem. Aquele a quem nunca escutaram, de quem reclamaram falar demais agora se cala. E Tudo o que foi criado foi destruído; toda a fidelidade traída; todo o trabalho prostituído. Dos envelopes pelas ruas, projetos de brinquedos, à poesia e pintura. Todos os meus heróis morreram ou foram para a Academia. O resto também me ignora como eu ignoro a eles. Quem precisa de construtores? De sonhos ninguém. Quem precisa de poetas? De poesia ninguém. Quem precisa de mim? Eu preciso. E dedicarei minha vitória e minha derrota àqueles que nunca precisaram de mim. Arrombaram a porta dos meus sonhos. Não precisava, eu lhes daria a chave. Um rei continua sendo rei sem um palácio. Lembrem-se disso quando chorarem. Saudades é coisa de capitalista; comunistas não sentem saudades. Só maldades. Mas eu tenho amigos comunistas que sentem saudades de mim. E eu deles. Invadam a minha construção. É sua herança e minha satisfação. Construí sobre a Terra. E a Terra não tem dono. Proprietário é o que constrói. E eu construí. Exerçam seu direito de herança, e façam o que eu não fiz: derrubem as paredes, taquem fogo na madeira. Incendeiem tudo. Eu lhes dou permissão para invadir. Pilhar. Destruir. Restaurem a dignidade. E ao restarem farpas, matem os lobos. Não uivem na esquina em vão. Entre o vão e a plataforma há um anão. De olhos claros e cabelos brancos. Anão moral. Impotente e preguiçoso. Coloquem um velho bêbado na cadeira de rodas e o empurrem ladeira abaixo. Há tipos e tipos de velhos. Inclusive velhos porcos, daqueles que acham que são humanos. São esses os piores. Não poupem suas balas. Prefiram as de hortelã. Atirem para matar. De rir. Ademais, não lhes dou o endereço, nem o código de endereçamento postal, nem o de barras. De chocolate. Visitem a mansão dos mortos, enquanto queimo nos portos as caravelas. As caravanas que passam atropelam os lobos. Pedras que rolam viram poeira. E eu continuo sem beira, nem beira. À beira. Do cais. Cães que ladram. Cães de guerra. Selvagens da Terra. Acordem, crianças, que não há mais onde pisar. A terra não aguenta mais seu peso. Deixem que afundem. Em Agosto. Cuspiram em meu rosto. E a contragosto fiquei calado. E em Setembro, se ainda lembro, serei falado. Até Outubro serei alado. E depois jamais será o antes. Nunca mais. Deixem seus recados após o sinal. Tu-tu-tu-tu...
28/07/2018

17/07/2018

Esgoto

Esgoto
Barata Cichetto

Aquele que nunca é convidado a uma festa, nunca pode ser acusado de chegar atrasado. Já em um velório, não é possível culpar o morto. A festa acabou. O velório é na porta ao lado. Deixem suas mensagens no livro preto de visitas. E mantenham suas consciências tranquilas. Não me convidaram para a festa que deram. Não foram na festa que eu dei. Não os convido para o velório, então. Fico sozinho. Com os vermes e as velas. Tirem as rosas do meu caixão. Detesto todo tipo de rosas. Incluindo adálias e margaridas. E outras flores fedorentas, com cheiro de morte e solidão. Deixem os vermes. São meus convidados. Estão dentro de mim há tempos. Convidem as chamas. As damas também, menos as das camélias, que essas são flores também. Roubaram tudo o que eu tinha, roubaram até o que eu não tinha. Queriam tudo. Ficaram sem nada. Por que a única coisa que eu tinha era a mim. E me roubaram de mim. Me deixaram sem eu. Agora sou apenas um deus, um anjo do inferno. Meu caralho é minha lança e enfio no seu rabo. Não geme. Não grita. Cala a boca e me esquece. Não desce do ônibus. Continua seu caminho. Não olha para trás. Não me ligue. Não ligo. Não digo. Não diga. Não diga alô. Nem adeus. Não digo adeus. Não estou morto. Não sou morto. Mortos são todos que roubam de mim meu direito de ser. O que sou. Apenas o esquecimento será sua herança. Não busque na lembrança minha imagem. Que por semelhança é torta. Não ore. Não chore. Não adore. Sua sorte não é sua. É emprestada. Devolva. E pague os juros. Sua casa não é sua. Sua bunda não é sua. Devolva as calcinhas que roubou do varal da vizinha. Devolva o que roubou. Não a mim. A mim não precisa. Nada do que me roubou tinha valor. Apenas preço. Empreste. Jogue. Queime. Engula. Morra. Escorra. Essas sentenças são tão extensas, e tão pouco extensas, mas foram feitas pelas minhas crenças. Se crê há. Se há crê. E se nada há, nada há de se perder. Nunca me perdi. Nunca perdi nada que não pudesse encontrar. Não me roubaste nada que eu não pudesse lhe dar. Não deixo lágrimas sobre a terra. Deixo apenas um nada enorme que jamais poderá preencher o buraco que há no seu caráter. Não deixo nenhuma culpa atrás da porta. Pode arrombar a minha casa. Pilhe o suor esparramado no chão, mas não se esqueça da maldição. Que nem todo o sangue podre poderá apagar. Não revise meu texto. Enfie no rabo seu pretexto. Foda-se o contexto. O sol é minha morada. Lá estou indo. Fique na tua escuridão.

17/07/2018

15/07/2018

Non Dvcor Dvco

Non Dvcor Dvco
Barata Cichetto


Eu nasci há sessenta anos, em São Paulo, uma cidade que na época ainda não era um gigante engolido pela ganância das oportunidades, uma espécie de New York de terceiro mundo. 
A cidade de São Paulo, nos anos cinquenta, que tinha completado quatrocentos anos de existência, ainda mantinha a predominância de imigrantes europeus, particularmente italianos, espanhóis e portugueses, mas começara a ser desenhada como uma cidade multicultural, que se tornou logo depois.
Filho e neto de paulistas e paulistanos, todos descendentes de italianos, cresci vendo essa cidade se tornar de poética á imunda.  A migração e imigração descontrolada fez a cidade perder seu charme, sua ousadia e sua poesia. Tornou-se uma cidade suja, emporcalhada e, para mim, perdeu tudo o que eu considerada valoroso.
Recentemente tomei um choque, com um fato que me aconteceu, ao entrar numa padaria para tomar um café: o balconista, com um sotaque nordestino carregado, me perguntou de onde era o meu sotaque. Só respondi que era daqui mesmo, mas me senti sinceramente desconfortável. E isso me fez pensar, analisando também outras coisas, que minha "mãe" já não me queria nos seus braços.
Observo há tempos, que todos os valores que sempre foram caros a paulistas e paulistanos, se perderam no meio de tanta cultura "externa". O próprio café, que sempre foi um orgulho paulista, que era servido forte e meio amargo, em copos de dose, passou a ser servido de acordo com o gosto nordestino, fraco, doce e em copo americano cheio, coisa que é absolutamente horrorosa.
Sob muitos pontos de vista, tendo pensamentos e atos progressistas, mas em outros, me reconheço como conservador, e creio que esse é meu ponto de equilíbrio. Há coisas que precisamos conservar, sim. Determinados valores que nos ligam às raízes, que são parte de nossa construção como ser humano. 
A decorrência disso, é que passei a me isolar dentro de casa. Sair, pegar ônibus e metrô virou uma tortura. A sujeira e a violência impregnada nas pessoas, que reagem sobre seus direitos, mas esquecem de reagir com a mesma força com seus deveres não é uma prerrogativa de São Paulo, mas dada a sua cultura plural demais, toma ares de quase esquizofrenia. Se alguém, como já aconteceu comigo, estiver parado do lado esquerdo numa escada rolante do metrô, é ofendido e maltratado, como se estivesse cometendo um crime contra os direitos humanos. Numa cidade como essa, todo mundo berra por seus direitos, desde o seu lado na escada, de pichar propriedade alheia, cagar na rua e ser, especialmente, violento.
O fato é que cansei da "mãe", cansei da "puta", cansei de ser maltratado dentro da minha própria casa. Quero de volta minhas raízes, quero de volta a minha paz. Coisas que sei que neste lugar nunca mais encontrarei. Alguns caminhos estão abertos, algumas portas se abrem. Não sei ainda onde essas portas e caminhos me levarão, mas uma coisa é certa: deixo essa terra. Non dvcor dvco. Longe daqui.

09/07/2018

25/06/2018

Viver é Fatal!

Viver é Fatal!
Barata Cichetto

Eu queria acordar pensando que foi um sonho. Que durou sessenta anos. Queria olhar no espelho e enxergar um rosto de criança, escovando os dentes de leite, depois colocar as calças curtas, a camisa branca, os suspensórios de couro, e por fim a gravatinha azul, presa com elástico e com apenas uma lista indicando primeiro ano escolar.
Queria sair pelas ruas correndo e comendo tardiamente o lanche não devorado no recreio, e até tomar um homérico tombo numa rua de terra do bairro quase sem casas. Queria ficar satisfeito em saber que tudo aquilo que vivi nos últimos sessenta anos tenha sido apenas um sonho, e que eu ainda tenha esses mesmos para construir uma vida.
Queria andar pelas ruas do centro da cidade, com pressa para entregar pacotes e envelopes de uma loja de peças da Rua Florêncio de Abreu, depois andar pela Paulista recém-ampliada, soltar camisinhas cheias de ar, feito bexigas, pelas janelas do prédio, sobre o telhado de dois casarões dos tempos dos barões do café.
Queria pensar que tudo foi um sonho, que todas essas coisas que eu vivi, eu ainda não vivi. Queria acreditar que ainda tenho que viver tudo isso, ainda. E o que é melhor, viver tudo isso de forma melhor e diferente. Queria pensar que acordei hoje de um sonho de sessenta anos. E viver tudo de novo. Ainda ter tempo, ainda ter muito tempo. 
Acontece que a vida não é sonho, nem bem, nem ruim. Não é sonho. A vida é real, tão real quanto podemos entender e sentir por realidade. A vida é fatal.
E na fatalidade do viver, corro ao espelho e velho um rosto enrugado debaixo de cabelos e barba brancos, não há mais dentes de leite, apenas dentadura. E não há mais uniformes escolares, nem caminhos de office-boy. Há o cansaço, há a amargura de quem sempre procurou o ser, não o ter. Há a textura na pele como marcas e provas de que nada foi um sonho. Tudo é real. Tão real quanto se possa sonhar.
25/06/1958

27/05/2018

Dia da Saudade

Dia da Saudade
Barata Cichetto

Acordei com saudades. Uma saudade sem lembrança. Todas as saudades são lembranças, mas não a minha. Não tinha rosto essa saudade, ao contrário de todas as saudades que se sente. A minha não era de ninguém, nem de mim mesmo. Era uma saudade surda, cega e muda. Uma saudade tão intensa e tão extensa que quase não pude perceber.  Mas sabia que ela estava ali. Quentinha feito uma buceta. Desleixada feito uma puta. Terna feito uma mãe. Eloquente feito um padre. E eu não sabia se eu a expulsava da minha cabeça com um tiro na fronte ou com uma gilete nos pulsos. Maldita saudades que eu não queria ter na minha cama. Que fosse até mesmo uma traveca de peitos de silicone, ainda vá lá, mas não essa saudade alienígena. Quem ela pensava ser para me abordar, me tirar da cama aos berros feito um policial à paisana? Hein? Quem era ela para me acordar desse jeito, feito uma telefonista de call center dizendo aguarde na linha, senhor, enquanto transferimos sua ligação? Que bosta era aquilo agora? Eu era apenas um pequeno escritor que nem sequer conseguira ter estatura para alcançar o espelho. E lá vinha aquela maldita saudade me atormentando feito uma empresa de cobrança que tentar negociar o boleto de uma calça que comprei tem cinco anos e ainda não paguei. Nem vou pagar. Foda-se essa saudade.
Fui à cozinha e preparei um café, depois sentei na mesa onde duas baratas batiam um papo sobre a ultima greve que a merda dos esquerdistas inventaram para foder com tudo. Elas fumavam uma bagana fedorenta e palitavam os dentes com ossos. E me olhavam de um jeito estranho que só baratas sabem olhar. Dei um tapa nas duas e as esmaguei contra o piso da cozinha. A saudade sentou na minha frente e ficou me olhando. Pensei em fazer com ela o que tinha feito com as baratas, mas ela me olhou bem fundo nos olhos e me deu um tapa no rosto que ardeu para caralho. Sua vadia, eu disse. E ela deu outro, do outro lado da cara. Sua puta. Tornei a gritar. E ela se levantou, abriu a porta e deixou duas cadelas enormes entrarem. Eram reluzentes e tinham duas bolas de gude cinzas no lugar dos olhos. E elas me devoraram com seus dentes afiados. Ainda vi minhas tripas sendo arrastadas pelo chão encerado da cozinha antes de fechar os olhos. As baratas se contorciam. E riam de mim, de um jeito que somente baratas sabem rir.
27/05/2018

26/05/2018

Bukowski Era Um Velho Desprezível

Bukowski Era Um Velho Desprezível
Barata Cichetto

Passei a tarde lendo outro livro de Bukowski. Que merda! Por que alguém se dá ao luxo de perder tempo com esse autointitulado "Velho Safado"? Charles era um desprezível. Toda sua prosa é desprezível. Sua poesia é desprezível. Mas nem todo mundo lê Bukowski hoje. Muita gente diz que lê, pois é ser "modinha". É legal dizer que leu, e depois ficar nessas merdas de redes de Internet vomitando frases dele, sem sequer entender que ele era um velho desprezível. Um bêbado que gostava de carros caros e ganhou muita grana. Não, Buk não é aquele camarada que te pediu uma pinga ontem à noite na porta do buteco onde cê tomava sua Heineken e tirava fotos para publicar. Se fosse ele, cê teria dado a bunda pra ele, mas como era só um velho cachaceiro, tu deus umas porradas nele e as putas que bebiam no seu copo melaram as calcinhas. Aliás, se fosse o velho Charles aquele bêbado babão e sem dentes, ele mesmo te daria umas porradas. E te deixaria com a boca sangrando e as putas chorando na porta do SUS. Mas não era, e cê o encheu de porradas e xingou ele de bêbado safado.  Se fosse ele, cê não viraria uma história dele, não viraria um conto, pois ele falava apenas de derrotados, não de idiotas.

26/05/2018

23/05/2018

Gosto de Mulheres Sacanas

Gosto de Mulheres Sacanas
Barata Cichetto

Adoro mulheres sacanas. Daquelas que gostam de sacanagem. Às quatro da manhã. Às três da tarde. A qualquer hora do dia. Com qualquer tempo. Nublado ou ensolarado. Frio ou quente. Doce ou salgado. Em qualquer hora. Do dia ou da noite. Até pendurada nos ponteiros do relógio. E em qualquer posição. Esquerda. Direita. Em cima. E por cima. Embaixo. E por baixo. Gosto de mulheres que gostam de sacanagem. De qualquer ideologia. Teologia. Fisiologia. Das misóginas às andróginas. Das vaginudas. Às peitudas. Das de peitos pequenos. Das de pernas longas. E de bunda dura. Ou macia. Gosto de mulheres sacanas. Mas aquelas bacanas. Que adoram chupar. E lamber. E grudar. E ficar grudada. Na parede. Feito lagartixa. Feito barata causando arrepio de tesão. Daquelas que causam lesão. Manchas roxas no pescoço. E fodem durante o almoço. Embaixo da mesa. De jantar. Gosto de mulheres sacanas. Que fodem de quatro. De cinco. E de mil. Sacanas bacanas. Que fodem em Abril. Em Maio. Ou em Outubro. No Dia da Criança. No Dia das Mães. No Dia da Poesia. Mulheres sacanas. Que gostam de ler. E de serem lidas. Polidas. Que lambem feridas. E se acham queridas. Gosto das sofridas. Da mal comidas. E das comidas bem. Gosto das fingidas. Que fingem que não gozam. Que fingem que não gosta. Que tem espasmos. E vomitam. Na minha boca. Palavras sem sentido. Só por sentir. Vontade de falar. Gosto das mal dormidas. Com olhos inchados. Cílios pintados. E bocas mal lambidas.  Adoro as feministas. As machistas. As comunistas e capitalistas. Das anarquistas. Idealistas. Aquelas as listas. De quem já comeu. De quem não deu. Gosto das fatalistas. Que querem morrer a cada orgasmo. Que morrem comigo. De tesão. Gosto das mulheres sacanas. Que fodem no meio da rua. Encostadas no poste. Na praça pública. Ou de alimentação. Que fodem na cama. Assistindo televisão. Comendo mação. E sentindo tesão. Gosto de mulheres sacanas. Americanas. Baianas. Do Bahamas. E de qualquer lugar. Que tenha mulheres bacanas. Sacanas. E como sacanagem pouca é bobagem. Que tenha a coragem. De ser sacana. E de ser bacana!

23/05/2018

19/05/2018

Manifesto do Macho Poeta

Manifesto do Macho Poeta
Barata Cichetto
Do Livro "A Solidão é Uma Ratazana Cinzenta" (antologia) - Maldita Editora de Poesia - 2018

Abaixo a todos os chatos. De galocha, que não mais existem. Ninguém mais usa galochas. Ninguém sabe o que são galochas. Eu usei galochas. Usei sapatos com saltos pregados. Sapatos de couro. Não de plástico. Usei Congas e Bambas. E usei cuecas Samba Canção. E usei calção, não "shorts" ou "bermudas". Coisas absurdas. Sou macho poeta. Poeta macho. Abaixo o que está embaixo. Nunca fumei maconha. É uma vergonha. Precisar ficar bem. À custa de remédios & outras drogas. É legal ficar bem. Fique bem! Abaixo as feministas. Feminismo é eufemismo. Abaixo o machismo. Abaixo o achismo. Abaixo o catecismo. O altruísmo. O comunismo. E o ceticismo. Abaixo todos os chatos. De boina. De camiseta do Chê. De camisa vermelha. E verde amarela. Da seleção. Não sou flor. Que se cheire. Nem que feda. Nem que ceda. Não sou seda. Conceda a próxima dança. Já dancei em bailes de garagem. Com Cuba Libre e Samba. Geração Tubaína. Sem Heroína. Nem Tubaína com Cocaína. Trepei com putas. Da São João. Com a Ipiranga. No "Século XX". E Um. Abaixo a todos os chatos. De Facebook. De Orkut. E do cu da mãe. Geração de merda. Politicamente correta. Impoliticamente certa. E politicamente reta. A torta e a direita. A torta e à esquerda.  E o tal do Deus, sentado à esquerda do filho. À direita do Espírito Santo. A abaixo do Amém. Doin. Do-In. Acupuntura. Contracultura. Contra a Cultura. Subcultura. Ideologia teológica. Teologia ideológica. Anarquia de esquerda. Sou anarco-monaquista. Não maniqueísta. Artista. O joio da joia. As joias da coroa. Fodi uma coroa. De quarenta quando eu tinha trinta. E poucos. Dentes. E ela tinha todos os dentes. Postiços. Dentadura. Abaixo a dentadura. Ela me chupou sem dentadura. Abaixo a ditadura. Dos dentes. Sou macho poeta. Acho poeta. Acho. Sem poesia. Gritando na rua. Sua solidão. E eu. Que nem sei ser poeta. Acho que perdi. A ilusão. E o tesão. De ser poeta. Perdi o trem. Que saía de Guaianases. E ia até a Luz. A estação. Perdi o trem. E a estação. A Primavera perdida. Em mil novecentos e sessenta e oito. O Inverno chega daqui a pouco. E o Outono nem sei quando é. O Verão é de esquerda. O Inverno de direita. Verão comunista. Quente. Inverno gelado. Na Sibéria. Coisa séria! E nem tudo que é sério é triste. E a tristeza nunca é infelicidade. Felicidade é quente. Fria é a realidade. Felicidade nunca rima com realidade. Vou pegar outro ônibus. E ir ao centro da Cidade. Que por infelicidade. Não fica no centro. Risque o mapa. Fica na Lapa.  Num hotel sem estrelas. Na beira da estação. E na Penha. Fica apenas meu coração. Minha cabeça pegou o Metrô. E desceu na Barra Funda. Ali fodi uma bunda. De uma lésbica com cara de David Bowie. Ou seria de Lou Reed? Ah... Eu sou macho poeta. Daqueles que não prestam. Que falam de putas. De lésbicas. E não entende sobre ideologia de gênero. Nem de ideologia. Nem de gênero. Não sou generoso. Sou oneroso. Horroroso. Então cai fora! Seu filho da puta. Sua filha da luta. Sua luta é uma puta. Detesto lutas. Prefiro às frutas. E outras rimas.  Das outras primas. Abaixo a guerrilha. A cigarrilha. E abaixo da virilha. Tem meu pau. Duro. Pendendo para a esquerda. Mas sempre para cima. Ou mole. Depois do gole. Sou perverso. Em meu universo. Há apenas estrelas. E um buraco negro onde enfio meu caralho. Jogo baralho com o Diabo. De pijama listrado no boteco da esquina. Palitando os dentes. E cuspindo nacos de carne do dia anterior. Sou escroto. Sou esgoto. Sou macho poeta. Me acho profeta. E ejaculo. Porra na tua cara. De satisfação. Foda-se a tua política. Teu partido quebrado. Partido. E teu pai filho da puta. Dei um soco na boca. Do estômago. Daquele que nunca foi meu pai. Sou macho poeta. Daquele que não empresta. Sua solidão. E que não manifesta. Nenhum gesto de perdão. Perdão é perda de tempo. Ao perdão prefiro a solidão. Ontem cuspi na tua cara. Toda minha indignação. Disse eu à nação. Indignação. Indigna nação. Meu sangue é italiano. Feito molho de macarrão. Sou macho poeta. Macho. Eu acho!
P.S.: Cuidado com macho poeta. Aquele que não empresta. Sua dignidade ao perdão. Cuidado com o macho poeta. Que não se afeta. Por pedidos de perdão. Cuidado com macho poeta. Que detesta. Feminazismo de ocasião. Cuidado com macho poeta. Que não atesta. Com marca na testa. Seu perdão. Seu tesão. E sua solidão. Cuidado com macho poeta. Que não presta. Que detesta. Podridão. Que não tem na testa. A marca do idiota. Do agiota. E do poliglota. E cuidado com macho poeta. Que é o que resta. Desse mundo sem macho. E sem poeta.

19/05/2018

14/05/2018

Em Terra de Cego, Quem Um Olho Só Ainda é Só Cego

Em Terra de Cego, Quem Um Olho Só Ainda é Só Cego
Barata Cichetto

Leia tudo. Mas leia certo. Com o olho da direita. E com o olho da esquerda. Visão esquerda. Visão direita. E que o olho do centro. Que não é o olho do cu. Pense. Reflita. E chegue a conclusão. Que não há olho à esquerda. Nem olho à direita. Apenas dois olhos juntos. Que enxergam apenas o que vêm na frente. Cor é ilusão. Tudo de fato é preto e branco. No mundo da política. Não há terceiro olho. Nem terceira via. A via é única. O caminho é único. Apenas um. Caminho individual. Cada um no seu. E a gente se encontrando em qualquer um. Não há caminho certo. Senão aquele que o individuo escolhe. E caminha. Sozinho ou acompanhado. Mas livre para escolher. Sem guarda. Nem guaritas. Sem guard rail. Que seja de asfalto. Que seja de pedra. Que seja de terra. Que cada um pavimente seu próprio caminho. Olhe a direita. Olhe a esquerda. E espere o comboio passar. O motorista bêbado do carro vermelho. O condutor cego do carro verde e amarelo. Espere. Pare na pista. Depois siga em frente. Que atrás sempre tem gente. Tem também na frente. E dos lados também. Mas não vomite na pista. Não cague na pista. Siga em frente. Abra os olhos. Ambos. Mire o alvo. E acerte na mosca. No retrovisor apenas poeira. De estrelas. Estrelas não têm cores. Não as pinte de vermelho. Não as tinja de sangue. Estrelas são puras. Siga na estrada. Cruze a encruzilhada. Despache com Robert Johnson. E não espere que santos lhes guiem. Ninguém é santo. Então... Leia tudo. Não espere por ninguém. Não confie nas placas vermelhas que te indicam a contramão. Elas são falsas. Não espere o sinal ficar verde para seguir em frente. Ele também mente. Não há ninguém apertando o botão. O botão de controle. E de autodestruição. Está dentro da sua cabeça. Siga sendo assim. Boneco androide programado para matar. Ou deixar de matar. A escolha é sua. O seu caminho não é o certo. O meu não é o errado. Estamos sempre no caminho. Que não leva a lugar nenhum. Não existe nada o que ser feito. Senão continuar a caminhar. Com os dois olhos abertos. Olhando para todos os lados. Da esquerda vem chumbo. Da direita vem bala. E de nenhuma direção vem sua condução. Não se deixe conduzir. Conduza. Dirija-se ao portão. De embarque. E desembarque sua bagagem. Só veja as estrelas. Que estão no céu. Rasgue seu véu. Quebre os óculos que o ditador lhe deu. Deixe seu sangue escorrer. Apenas o seu. De mais ninguém tem o direito. Lute. Ombro a ombro. Tenha a liberdade por companheira. Rasgue o dito. E o não dito. Ditos populares são malditos. Não finja que não leu. O que este vate escreveu. E se leu. E não escreveu. O pau comeu. E o palco é meu!

14/05/2018

08/05/2018

Há Um Inferno Dentro de Nós

Há Um Inferno Dentro de Nós
Barata Cichetto

Há um inferno dentro de nós. Que nos corrompe, engole e cospe em chamas. Há um inferno dentro de nós, que não nos castiga pelos erros, mas que nos devora pelos acertos. Há um inferno dentro de nós, que condena pela paz, nos prende pela liberdade, que nos martiriza pela arte. Existe um inferno dentro de nós que nos culpa pela desculpa, que nos mata pela vida e nos oprime pelo amor. Existe um inferno dentro de nós que nos destrói pelo que construímos, que nos mói pelo que erguemos, e nos atira no poço pelos nossos sonhos de voar. Que inferno é esse, afinal?

08/05/2018

07/05/2018

Comunismos Versus a Natureza Humana

Comunismos Versus a Natureza Humana
Luiz Carlos Cichetto

Um espermatozóide compete com milhões de outros para ser o único a fecundar um óvulo. Partindo desse fato, como é possível pensar em coletivismo, em igualdade? O ser humano é individualista e competitivo desde a sua origem, e tirar isso dele é simplesmente matá-lo. A humanidade cresceu, até chegar ao ponto onde hoje estamos, baseado essencialmente nisso. Cada item na evolução humana, desde o sujeito que, vendo um troco de árvore rolar e achou uso para ele, chamando-o de "roda", ou do outro, que passou décadas de uma vida criando um medicamento, escrevendo um livro, formulando uma tese cientifica. Todas essas coisas foram fruto de esforços individuais, que foram aproveitados pela humanidade depois. Toda conquista, toda pequena partícula do crescimento humano se deve inicialmente a um indivíduo. Mesmo num projeto feito por várias pessoas, o resultado é a soma de esforços e intelectos de cada um, resultando num conjunto.
Portanto, não tenho a menor dúvida em concluir, que qualquer tentativa de transformar o ser humano num "coletivo" é uma aberração, mais que ingênuo, mas mal intencionada.  O ser humano é competitivo e individualista, além de extremamente vaidoso. Todos nós somos assim. E qualquer tentativa, por parte de ideologias que pregam algum tipo de comunismo ou socialismo é mentirosa, falsa e interesseira. Um crime contra a humanidade, afinal.

07/05/2018

05/05/2018

Procura-se

Procura-se
Barata Cichetto

- Alguém viu o Poeta por aí? Ele saiu de casa há três dias. Disse que ia comprar pão. Pegou o dinheiro, o resto que a gente tinha, e saiu. Na padaria ninguém o viu. Nem no bar da esquina, onde ele tomava sua cachaça quando tinha alguém dinheiro. Ninguém o viu por aí? Ele estava vestindo calças sem cor e camisa invisível. Estava descalço, também. Antes de sair, ele escreveu um poema, disse que era o último. Está sobre a mesa da cozinha, todo molhado de lágrimas, ainda. Disse que tinha fome, sede e mais um monte de desejos que não podia realizar. Disse mesmo que queria voar. Sua fotografia é essa. Se alguém o vir, diga que volte para casa, mesmo sem asa.

03/05/2018

03/05/2018

Conta Comigo

Conta Comigo
Barata Cichetto

Conte comigo. Até cem. Ou mil. Conte por mim. Até cem. Conte. Conte. Conte uma história. Desconte cinquenta por cento. E fique com o troco. Conte comigo. Conte um conto. Sem desconto. Sem diminuir nem um ponto. Sem aumentar o preço. Conte o conto. Que eu aponto. O culpado. Dou endereço e telefone. Passo mais tarde. E lhe dou um abraço. Conte comigo. Perceba o perigo. De ser meu amigo. E corra. Desapareça. Antes que anoiteça. E não se esqueça de deixar. A chave na fechadura. E de deixar minha dentadura. No copo sobre o armário do banheiro. E algum dinheiro. Das contas. Que contas. Sem contar. Conta comigo. Conta! Parei de contar. Quando chegou a conta. Da energia elétrica. A fatura. Da fratura. Da minha perna. E chegou a escritura. Do terreno em alto mar. Da tortura. Da ditadura. E da amargura. Que eu não soube contar. Conte comigo!
03/05/2018

29/04/2018

Por Pouco...

Por Pouco...
Barata Cichetto

Pouco a pouco, dia após dia, vou matando todos os meus sonhos, tirando-os do caminho, já que a necessidade assim o exige. Primeiro foram as pinturas, já que a censura e a falta de interesse por elas as tornou empecilho. Depois foram o programa de rádio, e a própria webradio, já que não havia interesse. A poesia se tornou mecânica, algo como tomar remédio sabendo que não fará efeito, pois a doença é fatal. Então, cercado de todos os lados por ervas daninhas, abandonei o jardim. Depois vieram as outras coisas, como ir até o portão, abrir a porta, dar a descarga, lavar a louça e tomar banho. Até a música, velha e imortal companheira deixou de me encantar. E já que era assim, deixei de cantar, e de sorrir, e até mesmo de chorar. Esqueci como se faz essas coisas, e nem tenho vontade de lembrar. Fui esquecendo de tudo, a memória ficou cada dia mais fraca, o corpo mais dolorido, e os caminhos ficaram a cada dia mais difíceis de percorrer. Cada passo se tornou um martírio. Fui, assim, aos poucos, mas não tão rápido quanto queria, matando todos os desejos, que alguns chamam de sonhos e outros de esperança. Não, esperança não tem nada a ver com isso, pois essa eu matei muito antes, nos momentos em que fui traído, esquecido, amordaçado; quando mentiram sobre mim, quando disseram que não fiz o que deveria ter feito. Que fiz o que não devia ter feito. E as portas já não me dizem nada, não as suporto. De todas as que abri, fui deixado do lado de fora. Me sinto emparedado. Não abro as cortinas, não quero ver o sol, nem a lua. Muito menos a rua. Não quero mais abrir os olhos. E assim, pouco a pouco, vou matando tudo o que tem dentro de mim, pois o que está fora, está morto há muito tempo. Agora, é só esperar o tempo acabar...

29/04/2018

15/04/2018

A Morte Será Minha Vingança


A Morte Será Minha Vingança
Barata Cichetto

A morte será minha vingança. Vingança contra aqueles que não sentiram minha poesia e me deixaram no limbo; que mudaram minha história para fazer grande a sua e da sua mediocridade grandeza; que mentiram sobre mim para justificar seu caráter escroto e sua preguiça maldita. Minha morte será minha vingança sobre aqueles que me traíram e depois me julgaram, contra aqueles que não reconhecem o que foi dado, garantido e ensinado. Contra as mentiras imputadas, contra verdades mal contadas e alegrias roubadas. Vingança contra aqueles que roeram minhas carnes e cuspiram meus ossos; contra aqueles que sugaram meu sangue e deixaram álcool em minhas veias. Minha morte será a minha vingança contra os malditos que zombaram de mim, me enxotaram de casas que nem eram deles, que me jogaram na rua a meia noite. Minha morte será minha vingança contra aqueles que entraram por portas que abri e me deixaram do lado de fora; contra aqueles que se regozijaram na festa que eu preparei e me negaram o ultimo trago. Contra aqueles que não entenderam o livro que eu dei e era meu. Àqueles que me negaram um feliz aniversário e que roubaram meu bolo; e aquelas que foram meu bolo azedo, que mancharam de esperma meu cachecol, que jogaram a calcinha no lixo lotada de esperma alheio. Vingança contra as putas que não gozaram comigo e contra as lésbicas que gozaram contigo, contra o anel de casamento vendido e contra filhos jogados na latrina por engano. Minha vingança será minha morte e a morte do meu caralho renegado, da minha língua não beijada e de meus dedos não enfiados. Vingança do gozo dado a esmo e do esperma desperdiçado. Minha vingança será minha morte enquanto vivem, nesse mundo morto e sem esperanças. Será minha vingança estar morto enquanto vivem com suas malditas consciências a lhes perturbar o sono. Minha vingança é antes de morrer, saber que procuram nas igrejas podres o perdão de um deus construído sobre a lama de civilizações, sobre ossos de inocentes. Minha vingança será minha morte, mesmo antes de morrer. Minha morte será minha vingança, com seu choro falso diante de meu caixão e a doença que te corrói a alma. Minha vingança é meu silêncio de morto. Minha vingança será as lágrimas que derramarem no meu velório, lágrimas que roubaram de mim. Minha morte minha vingança, minha morte sua herança. Mas minha vingança maior é estar vivo, antes de morrer!

22/07/2015

12/04/2018

(Jurame) Cartas Online a Poeta Alejandra Arce


(Jurame)
Cartas Online a Poeta Alejandra Arce

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24 de setembro de 2015 • São Paulo

Querida Alejandra Arce D Fenelon:
Confesso-me surpreso e surpreendido com teu chamado à escrever cartas num espaço tão estranho. Antes, costumava escrevê-las à mão, em papel de embrulho nas épocas magras, depois comprei uma máquina de escrever, estilosa, vermelha, e de lá saiam minhas correspondências à poetas amigos. Era um tempo dificílimo, mas o matraquear das teclas negras durante noites inteiras de solidão, enchiam de esperança minha mente. Cartas aos poetas do mundo, ao mundo dos poetas. Cartas internas, endereças a mim mesmo, que nunca foram entregues. Até hoje espero chegar essas cartas, feito alguém apaixonado, no portão, a espera da carta amorosa que nunca chegou. Quebrou-se o portão, mudou-se a vizinhança, o Carteiro se aposentou. E o Poeta morreu. As cartas, essas devem estar perdidas nalgum porão escuro, meio roídas por ratos ou baratas. Ainda existem? Quanta esperança existe numa carta escrita em noites de solidão, feito esta em que lhe escrevo? Quanta dor existe em noites tristes feito esta em que lhe escrevo esta carta, não mais num teclado de máquina de escrever, mas de computador? Quanta angústia, quanta perversidade? É perversa a madrugada dos insones, malvada a esperança aos que sonham.

Esperança é uma maldição religiosa, portanto, junto com todas as relíquias religiosas, incluindo crucifixos, rezas e perdão, as atirei no lixo. Não creio mais nessas coisas. Tanto quando joguei no lixo todos os dogmas malditos, todos os desejos benditos, todas as ideologias falsas e mentirosas. Joguei no lixo até mesmo quase que a totalidade do meu ser. Quase tudo se foi. Restou apenas um pequeno pedaço de poesia, que ainda me mantém respirando.

E é esse pequeno pedaço que entrego-lhe, nesta noite em que até os gatos dormem, não há corujas e nem sequer um trinado de um pássaro noturno se escuta. Os cachorros dos vizinhos, sempre barulhentos, emudeceram. Não há mais nada, querida Alejandra. Nada mais. A maldição da humanidade chega ao fim. A maldade reina. Resta-me apenas o desespero, que expresso nesta primeira carta, que lhe entrego. Ainda com o que resta de mim.

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24 de setembro de 2015 • São Paulo

Honey...
Depois da ultima carta, me peguei escutando Ely Guerra, a quem não conhecia. A força dessa moça é algo extraordinário. Ainda não consegui dormir e olhe que a noite não acaba. É triste. Estou com uma forte dor de cabeça desde ontem de manhã. Não sei, mas tem horas que penso que minha cabeça irá explodir. Queria ter alguém com quem falar, nestas horas, mas todos parecem estar dormindo. Mas muitos simplesmente estão surdos. Que esta carta a encontre de manhã. Sonolenta, ainda, de pés descalços. Minhas gatas dormem no meu colo. E sinto que por elas sou querido. Bom dia, minha amiga!


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26 de setembro de 2015 • São Paulo

Honey...
Todas as madrugadas pertencem às sombras. E todas as sombras à solidão. Erroneamente pensam os poetas que as sombras são coisas do passado. Enganam-se. São tolos em achar que sombras são culpas, atos, fatos. Pois que são as sombras, minha amiga, Poeta da noite, do futuro. Nós as projetamos à nossa frente, com nossos corpos opacos. E é por isso que as tememos tanto. As sombras, que tanto tememos, que tanto cortejamos em poemas, negras, escuras, sombrias, são de fato nossos medos, estampados na parede da frente. E essas sombras, que por vezes chamamos de solidão, são apenas o medo. E se essas sombras podem ser as da morte, mas podem ser também as de uma eternidade que nunca compreendemos, presos à dogmas e ideologias imprecisas e burras. Não há eternidade ao corpo, mesmo nossas tão decantadas obras não serão eternas, mas há uma coisa, algo que de fato não nos reflete no passado, mas no eterno, que são as sombras, que se projetam num universo tão extenso que nunca seremos capazes de compreender, numa espiral ascendente gerada pelo próprio medo- sombra. Portanto, o que temos, de fato é o medo... De nossa própria eternidade..De nossa própria sombra. Solidão infinita. Eterna.

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2 de Outubro de 2015 • São Paulo
Querida Poeta..
Há tempos que cartas não chegam. Mataram o carteiro, ou mataram o poeta? O mundo moderno não carece mais de uma nem de outra coisa. Há solidão apenas. E não encontro agora nas palavras o consolo que sempre achei. Não há. As palavras estão mortas. Feito carteiros e poetas. Queria encontrar uma forma de aplacar essa angustia que corrói, destrói e amaldiçoa meu espírito. Há muito não sei o que é dormir direito. Insônia é a maldição. Esperei que desejasses boa noite, numa postagem de Facebook para escrever-te. Fico tímido diante de tua presença. Sou um tolo, eu sei. Mas, o que pode ser feito, se a tolice é minha irmã gêmea? Quero estar longe. De mim. Longe de meu próprio cheiro. Longe. Apenas longe. De qualquer lugar. De qualquer coisa. De qualquer alguém. A distância. Inconstância. Há um deserto enorme a minha frente. Dentro de mim. Apenas areia que não move uma ampulheta. O tempo perdido. O espaço perdido. A busca perdida. Inútil busca. Nada há a ser encontrado. Nada. Apenas o nada. E se há tempos não recebo uma carta, foi que dentro de mim nada mais deseja, nada mais busca, nada mais procura. Não há! Nada. Beso, mi querida amiga.

Meu Nome é Alguém

Meu Nome é Alguém
Barata Cichetto

Vou logo avisando: sou perigoso! Peguei uma ideia ontem guardada em cima do armário fedorento do meu cérebro e carreguei minha espingarda. Munição quente. Felicidade e chumbo grosso. Em tempos grossos, como bem escreveu o poeta que era eu mesmo, é preciso andar armado. Queria andar amado, mas fui desarmado. Desalmado? Não tenho alma, troquei por um par de botas com uma diaba gostosinha que chupava meu pinto. Sinto, mas perdi a alma com ela. E a identidade? Não tenho também. Esqueci num motel quando fui comer uma puta negona de dezenove anos que queria que eu pagasse para comer o cu dela. Eu não pago para comer cu. Só pago por boquete. Como paguei para a Ivonete, uma puta asmática da Rua dos Andradas Meia Nove.  Ivonete me deu seu canivete. E eu lhe dei uma dentada no bico do seio. Que feio, Senhor Barata! Por isso repito: eu sou perigoso. Nervoso. Brioso. Horroroso. Medroso. E quem tem medo é perigoso. Quem tem fome também. Eu tenho fome. Do seu nome. Sou aquele que te come. Ao anoitecer. Sou perigoso, eu digo, e meu amigo, meu comparsa de crimes é Rimbaud. Aquela bicha mercenária. Mas voltando ao que falava, quando fui interrompido pelo matraquear febril das minhas lembranças: sou perigoso. Mas não daquela espécie de danoso, que paga por pensamentos, que esfacela crânios com machados ideológicos; que rompe cabaços de virgens de doze anos apenas por diversão. Não sou perigoso feito àqueles que abortam por vaidade, que matam por felicidade e zombam de mim pelos meus dentes podres. Sou perigoso, mas não sou criminoso. Não hasteio bandeiras vermelhas com foice e martelo, nem de cor nenhuma. Não acredito na ordem nem no progresso. Encaro um processo? Por injuria a pátria amada? Sou perigoso, pois que com minhas letras posso causar um terremoto. Então me mantém à distância. Segura. Não faço arte coletiva, que isso não existe; não faço arte social, que isso também não. Subverto o tom da palavra, o som das letras e mando todo mundo tomar no cu. Bando de filhasdasputas esses, que acorrentaram minha sede num poço sem fundo. Bando de desgraçados vermes imundos que me deixaram a deriva num barco embriagado num mar revolto. Mas cuidado comigo, sou perigoso. Um perigo a mim mesmo. Minha mãe chora por mim. Eu não choro por ela. Ela afirma que me conhece, mas não tão bem quanto eu a conheço: eu a vi por dentro, conheço suas tripas, rim, coração, tudo por dentro. Eu estive dentro dela, mas ela nunca esteve dentro de mim. Não chore, mãe! Limpe a gaiola dos passarinhos. Dê banho no cachorro. Minha mulher também chora. Ela não sabe o que sentir-se burro feito um tijolo, estúpido feito uma porta. E eu me coço para dormir, enfio o joelho no meio da sua bunda e lhe faço cafuné. Sou perigoso, afinal. Gosto de comer seu cu. Mas ela me faz um boquete. Melhor que da Ivonete. Pobre esposa penso eu, casar justo com um homem perigoso feito eu. Não, decididamente ela não sabe do perigo que corre. Ela tentou correr, mas só chegou até a esquina. Eu a peguei pelo pescoço e a trouxe de volta. Comigo ela jorra litros de tesão. Não é com qualquer um. Tenho dedos mágicos e uma língua comprida. Gosto da sensação de vê-la estremecer num choque elétrico e deixar jorrar litros de liquido transparente. Gosto de ver jorrar. Sou perigo por isso também. Eu lhe conto minhas histórias perversas sobre criar filhos, ela me conta suas mazelas.  Somos ambos infiéis até que a morte nos separe. Todos que eu digo é todos, mesmo! Mesmo que seja na punheta ou na siririca. A vaidade é a perenidade da espécie humana. Sou infiel a mim. Trai a mim quando decidi não trair ninguém. Mas eu e ela temos algo em comum: somos perigosos. Ela não ama ninguém. E eu, a alguém que nunca existirá, o que é a mesma coisa. Sou escritor e a criei a minha imagem e perfeição. A perfeita imperfeição da minha feição. Sou escritor e tenho meu escritório. O escritório do escritor é seu laboratório. Peremptório. Inglório. Ela tem filhos bastardos. Ignorados por bastardos. Gloriosos pela visão dos ciosos. Deliciosos momentos de fornicação em barracas de camping, em salões de baile esfumaçados. E filhos. Não tenho filhos, segundo os próprios. Renegaram. A não ser no momento da precisão. Por imprecisão cármica. Sou perigo por isso também. Amém. E amem alguém. Ninguém? Ninguém também é alguém. Meu nome não é Johnny, nem Ninguém. Meu nome é Alguém.

11/04/2018

Profissão: Escritor

Profissão: Escritor
Barata Cichetto

Ontem escrevi "Escritor" num documento, no campo destinado à "Profissão". Nunca tenha escrito isso antes. Não por deixar de me considerar, não por não me reconhecer como tal, mas talvez por vergonha em assumir uma profissão tão relegada, maltratada e mal compreendida. O que meus familiares iriam pensar? Que sou um vagabundo? Um preguiçoso? Um folgado. Sim, iriam pensar isso. Aliás, não iriam pensar: pensam assim.

Já coloquei: "Oficce Boy", "Bancário", "Projetista Mecânico", "Auxiliar de Escritório", "Técnico em Informática" e muitas outras. Afinal durante uns trinta anos tive profissões "dignas", com Carteira de Trabalho, horário de almoçar, tomar café, chegar, ir embora, faltar, tirar férias, ter décimo terceiro, etc. Tinha horários definidos, trabalhos definidos, tudo definido. Não por mim, mas por aqueles que os definiam. Tinha horário para transar, que não podia nem ser tão cedo e nem tão tarde. Tinha horário para qualquer coisa. Cartilhas, manuais, procedimentos, etc. Mas a única coisa que não tinha horário era o de sonhar. De aplicar, de trabalhar por sonhos. Esse horário não tinha em meu relógio de pulso. Aliás, sempre tinha um. Ou dois.

Quanto tempo para acordar, cagar e tomar banho. Vestir a roupa, tomar café? Quanto tempo para chegar ao ponto do ônibus? Quanto tempo de trajeto? Quanto tempo? Quanto tempo para realizar a maldita tarefa que um chefete ordinário me destinava a cumprir uma tarefa que só ele sabia para quê. Ele tinha que manter a todos ocupados. Era sua missão. Ocupar nosso tempo.

Mas eu sempre arrumava um tempo. Minha profissão era exercida às escondidas. No ônibus que chacoalhava a caminho do trabalho, sentado na privada da empresa, cagando e escrevendo com o papel escorado na porta, no meio da madrugada no sofá da sala quando perdia o sono com alguma preocupação financeira ou alguma maldita ideia para um texto. Isso era ser um escritor maldito, escrevendo a despeito da maldição despejada por todos ao redor. Mas jamais seria uma profissão.

Há tempos, soltei as amarras. Perdi as estribeiras, o medo e até o respeito por aqueles que queriam que eu fosse um profissional pela metade. Decidi ser profissional inteiro. Mesmo que eu não tenha o declarar ao Imposto de Renda, mesmo que nada me renda, mesmo que não gere impostos, mesmo assim passei a considerar a escrita como profissão. Tolice? Ingenuidade?  Qualquer coisa. Pode ser, sim! O fato de alguém não ganhar dinheiro com uma profissão não faz desse alguém menos profissional. Um profissional é definido pela sua forma de trabalhar, de buscar aprender mais, melhorar seus conhecimentos para ter um resultado com mais qualidade ao se exercício profissional. E isso faço tão bem quanto quando procurava, como Office Boy conhecer mais ruas; manejar carimbos de forma mais eficaz como bancário e auxiliar de escritório; ou quando procurava ler todos os manuais sobre problemas físicos e lógicos de um computador. É assim. Ser profissional não é medido pelo numero representado num holerite de pagamento.

 Assim, represento uma classe cada vez mais desvalorizada, entre outras coisas pelo excesso de gente se candidatando à vaga. Há gente demais se arvorando em escritor sem a menor qualificação. Há até alguns editores picaretas vendendo curso para escritor. As facilidades da informática e a vaidade também são culpadas do baixo nível dos pretensos escritores. Nunca tive facilidades para escrever. Escrevo antes de existir Internet e escreverei se um dia ela deixar de existir. Não sofro de arrogância e vaidade artísticas, mas como profissional dedicado a ser sempre o melhor em sua profissão, torço o nariz para aprendizes arrogantes.

Enfim, tenho orgulho em colocar, sem mais vergonha nem qualquer tipo de constrangimento, a palavra "Escritor", no campo destinado a "Profissão".

11/10/2015

05/04/2018

Pagu

Pagu

Sou apenas um pequeno escritor. Um metro e oitenta e sete de dor. E nada mais. A contar. A escrever. A querer. Quero apenas entrar. Nas tuas entranhas. Brancas. Estranhas. Francas. Espetáculo fechado. Ingressos esgotados. A preços populares. E nos lares. E bares. Beber teu cuspe. Cuspir nos dedos. E te masturbar. No bar. Enquanto tomamos café. Amargo. E enquanto eu trago. Meu cigarro. Minha mão nas tuas coxas. Debaixo da tua saia. E antes que caia. O véu da noite. Te levar ao motel. Te levar ao céu. Ou ao Inferno. Eterno. Ainda há tempo. De você gozar. E melar minha mão. Com suco de tesão. Com suco de limão. E depois. Na minha solidão. Acompanhado de outra. Bater punheta. E melar o lençol. Pensando na tua buceta. Nas tuas pequenas tetas. E na tua bunda pequena e branquinha. E cedo. Mais cedo. Te comer de novo. Pão com ovo. Ouvir uma canção da Patti, a Smith. Que eu queria comer. Mas não comi. E ela nem soube que eu existi. Apenas um pequeno escritor. Sem pinta de ator. Que pinta com dor. E que apenas por ensejo. Se fez escritor. 

05/04/2018